Monday, September 29, 2014

O governo de São Paulo e o problema da gestão hídrica:

Crise hídrica no Estado de São Paulo: “Resta água para apenas 38 dias”

Segundo especialista da ONG TNC, é preciso fazer um esforço como o do combate à inflação, e “perguntar ao Governo por que ele não toma outras medidas” para sanar a crise no abastecimento.
A reportagem é de Marina Rossi e publicada por El País, 26-09-2014.
“É muito crítico” o estado em que as reservas do Sistema Cantareira se encontram, segundo o especialista em água da ONG internacional The Nature Conservancy (TNC), Samuel Barreto. “Se nada for feito, restam menos de 40 dias; diria 38 dias” de abastecimento de água para São Paulo e região.
Sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de 14 milhões de pessoas da grande São Paulo e de 62 cidades do interior, opera, neste momento, com 7,4% de sua capacidade total. É o menor índice da história. Mais baixo até do que em 15 de maio deste ano, quando o Cantareira operava com 8,2% de suas capacidades e o chamado ‘volume morto’ passou a ser captado.
Na época, além do acesso ao volume morto, o Governo do Estado passou a dar descontos na conta de água para quem economizasse. Mas esse bônus não foi o suficiente para sanar o problema. “Precisamos fazer um esforço como o que é feito no combate à inflação”, diz Barreto. Ainda dá pra economizar muito mais. Mas só o processo voluntário não é o suficiente. É preciso perguntar ao Governo por que ele não toma outras medidas”, diz.
Hoje, um segundo volume morto ainda pode ser acessado. Mas essa segunda alternativa não representa, necessariamente, a salvação. “Esse segundo volume morto representaria 90 bilhões de metros cúbicos de água a mais. Mas o ponto é discutir as regras para operar esse volume”, diz Barreto, que explica que, usando essa alternativa e se a estiagem permanecer, no ano que vem não haverá reserva alguma para socorrer a crise do abastecimento. “Acessando esse segundo andar do volume morto, você torna mais vulnerável o sistema para o ano que vem”, diz.
Segundo Barreto, a obra para explorar essa nova reserva já foi autorizada, mas o acesso a ela ainda não foi permitido. E um dos órgãos responsáveis por autorizar esse acesso é a Agência Nacional de Água (ANA), órgão controlado pelo Governo federal e que, na sexta-feira passada, anunciou a sua saída do Grupo de Técnico de Assessoramento para a Gestão do Sistema Cantareira (GTAG), por discordar da postura da Secretaria Estadual de Recursos Hídricos sobre os limites adotados para a captação de água e abastecimento. Criado em fevereiro deste ano, o Grupo tinha como função assessorar a administração do armazenamento de água do Cantareira.
Nesta semana, a TNC enviou um comunicado à imprensa pedindo o retorno da ANA ao Grupo. “A TNC vê com extrema preocupação o anúncio publicado pela ANA sobre a sua retirada do Gtac. Apelamos para o retorno imediato da ANA o Grupo”, dizia a nota. “A ANA tem um papel muito importante na definição das regras operativas, inclusive no Cantareira”, diz Samuel Barreto.
“Para voltarmos ao GTAG, só com o secretário [Mauro Arce, da Secretaria de Recursos Hídricos] assumindo os compromissos ou esclarecendo publicamente porque não tem condições de cumpri-los”, disse o presidente da ANA,Vicente Andreu.
Embora o governo não assuma, há meses diversos bairros da capital e cidades inteiras do interior estão vivendo na pele um racionamento silencioso de água: não há informe oficial, apenas as torneiras secas durante horas – e às vezes dias – a fio.
Nessa semana, pela primeira vez, o secretário de Recursos Hídricos de São Paulo, Mario Arce, admitiu: “Não estamos escondendo nada de ninguém. Não preciso decretar que está tendo um racionamento, tá na cara que existe um problema”, disse, na terça-feira, em um evento no Parque Ibirapuera. Nesta quinta-feira, Arce voltou a falar e disse que a água do primeiro volume morto duraria até o dia 21 de novembro.
Enquanto se discute se temos 38 ou 57 dias, a Câmara dos Vereadores de São Paulo convocou, pela segunda vez, a presidenta do órgão, Dilma Pena, para depor na CPI da Sabesp, criada em agosto. A segunda convocação a qual ela se fez ausente ocorreu nesta quarta-feira, quando Pena enviou um atestado médico para justificar a ausência.
São Paulo não tem um período de chuva acima da média desde o ano passado. À estiagem se junta a falta de uma atitude mais enérgica por parte do Governo do Estado. Em 2001, o Brasil viveu algo parecido, mas com a energia elétrica. A falta de investimentos na geração e distribuição de energia, aliada à ausência de chuva – quase toda a energia do Brasil é produzida por usinas hidrelétricas – fez com que a população sofresse uma sequência de pequenos apagões energéticos, que culminou em um esforço nacional - e obrigatório – de racionamento de energia. O último ano do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) acabou marcado negativamente pela “crise do apagão”.
Segundo Barreto, para que a crise hídrica começasse a ser resolvida seria preciso que um esforço como o que aconteceu, involuntariamente, em 2001, ocorresse novamente. “É preciso estabelecer uma meta de redução e ir além do ato voluntário”.

O filósofo Castor Bartolomé Ruiz aproxima os conceitos de Culpa e Dívida, para evidenciar os modos como a lógica sacrifical nos submete ao Capitalismo

A dívida como dispositivo biopolítico de governo da vida humana

O filósofo Castor Bartolomé Ruiz aproxima os conceitos de Culpa e Dívida, para evidenciar os modos como a lógica sacrifical nos submete ao Capitalismo

Por: Márcia Junges e Andriolli Costa

Em alemão, a palavra schuld é utilizada para significar “dívida” ou “débito”. Curiosamente, o mesmo termo pode ser utilizado, em outro contexto, no sentido de “culpa”. A ambiguidade não passa despercebida para Walter Benjamin, que chama atenção para o fato em Capitalismo como Religião (São Paulo: Boitempo, 2013). A partir desta reflexão, o filósofo Castor Bartolomé Ruiz discorre sobre os modos como o sacrifício foi incorporado secularmente no capitalismo na categoria de dívida. “A dívida se tornou, para o capitalismo, o meio de culpar a vida humana de modo a exigir dela o sacrifício necessário para compensar o que deve”, afirma ele. 
“O dispositivo teológico do sacrifício foi interiorizado como técnica econômica de governo. O capitalismo financeiro só pode subsistir produzindo dívidas. Na hipótese de que não houvesse ninguém com dívidas, o capitalismo financeiro entraria em um colapso total. É a dívida que gera o lucro.” A culpa no Capitalismo, no entanto, não é expiante, mas é mais e mais culpabilizante, e seu único modo de remissão é o sacrifício através de um trabalho maior, mais extenuante ou mais explorado. Desta forma, alerta, “temos aqui sinalizado um dispositivo biopolítico de governo da vida humana”.
Nesta entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, o filósofo retoma também a discussão sobre a entificação do Mercado que, a princípio, não seria nada mais que uma forma de organizar a produção, a comercialização e as relações econômicas entre pessoas e sociedades, mas que passa a dominar e objetificar o homem. “O mercado foi ressignificado como se fosse uma entidade com natureza própria (...), cuja natureza se rege pelo interesse próprio dos indivíduos”, explica. Ruiz expõe ainda o egoísmo como estruturante do mercado, e afirma: “o egoísmo foi instituído como categoria antropológica da natureza humana que por sua vez estrutura o modo natural do mercado de se comportar”.
Castor Bartolomé Ruiz é graduado em Filosofia pela Universidade de Comillas, na Espanha, com mestrado em história pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e doutorado em Filosofia pela Universidade de Deusto, Espanha. É pós-doutor pelo Conselho Superior de Investigações Científicas. Atualmente é professor nos cursos de graduação e pós-graduação em Filosofia da Unisinos. Entre outros, destacamos os seguintes livros de sua autoria: Os paradoxos do imaginário (São Leopoldo: Unisinos, 2003); Os labirintos do poder. O poder (do) simbólico e os modos de subjetivação (Porto Alegre: Escritos, 2004) e As encruzilhadas do humanismo. A subjetividade e alteridade ante os dilemas do poder ético (Petrópolis: Vozes, 2006). 
Confira a entrevista.

IHU On-Line - A partir da obra O reino e a glória (São Paulo: Boitempo, 2011), de Agamben , em que medida pode-se dizer que a lógica sacrificial da religião “entrou” no capitalismo?
Castor Bartolomé Ruiz - A obra de Agamben O Reino e a Glória é uma pesquisa sobre a arqueologia das formas de governo nas sociedades ocidentais e sua matriz teológica. Nela há referências ao sacrifício, porém sua tese principal é que o aparato conceitual do governo da vida, implementado nas modernas técnicas de governo e administração (como o contrato e o mercado, entre outras), foi desenvolvido nos debates teológicos sobre o governo providencial do mundo por Deus. A matriz teológica cristã retoma a problemática da filosofia estoica  sobre a providência do mundo, porém desenvolve a tensão que há entre a soberania imutável da natureza divina e o governo providente da liberdade humana. Segundo Agamben, essa fissura entre soberania e governo, que foi detectada pela teologia, se mantém como fissura da política ocidental tal e como a conhecemos na modernidade. Ela é a chave hermenêutica para compreendermos criticamente nossos dispositivos de governo e soberania.
Nesta obra, Agamben não desenvolve o que poderíamos chamar uma arqueologia política do sacrifício. Esta é uma pesquisa que talvez esteja por ser feita em toda sua profundidade e dimensão. Contudo, há reflexões que já esboçaram esta problemática. Destaco, entre outros, o fragmento de artigo de Walter Benjamin : O capitalismo como religião (São Paulo: Boitempo, 2013). Neste ensaio, Benjamin explora a dimensão religiosa do capitalismo, em especial através de seu componente sacrificial. O sacrifício foi incorporado secularmente no capitalismo na categoria de dívida (Schuld, que também significa culpa). 
Endividamento
Teologicamente, a genealogia do sacrifício se justifica como pagamento de uma culpa, que é dívida contraída com a divindade. Através da dívida a vida humana se torna culpada, e por sua vez se vê obrigada a pagar com sacrifício. A culpa gerada pela dívida justifica a necessidade do sacrifício como dispositivo compensador. A vida endividada é uma vida culpada que deve sacrificar-se para pagar a dívida. A vida endividada está condenada ao sacrifício. 
O capitalismo, analisa Benjamin, fez da dívida um de seus principais mecanismos de sustentação. A dívida se tornou, para o capitalismo, o meio de culpar a vida humana de modo a exigir dela o sacrifício necessário para compensar o que deve. O dispositivo teológico do sacrifício foi interiorizado como técnica econômica de governo. O capitalismo financeiro só pode subsistir produzindo dívidas. A dívida dos outros gera o lucro dos credores. Na hipótese de que não houvesse ninguém com dívidas, o capitalismo financeiro entraria em um colapso total. É a dívida que gera o lucro. Este dispositivo induz o capital a oferecer créditos fáceis para estimular o endividamento amplo. Quanto mais pessoas se endividarem, maior é o lucro que se obterá delas. 
Dispositivo sacrificial da dívida
O dispositivo da dívida é constantemente ativado pelo capitalismo como meio de manter funcionando o sistema. A conjuntura em que vivemos de uma ampla oferta de crédito tem por objetivo manter e ampliar o dispositivo sacrificial da dívida como meio econômico de governar lucrativamente a vida dos outros. As pessoas endividadas terão que dedicar longos períodos de sua vida a trabalhar sacrificadamente para compensar a dívida adquirida. O trabalho para pagar a dívida representa a oferta do sacrifício desse tempo de vida para compensar a culpa inerente ao crédito. Quem se endivida terá que sacrificar-se. Para que o sistema de acumulação do lucro funcione, haverá que estimular o endividamento através do crédito relativamente fácil, embora com garantias. 
O sacrifício, através da dívida, tornou-se um dispositivo gerador de lucro, mas também uma técnica de governo da vida humana. As vidas endividadas são vidas governadas pela culpa cujo único meio de remissão é o sacrifício através de um trabalho maior, mais extenuante ou mais explorado. Temos aqui sinalizado um dispositivo biopolítico de governo da vida humana.
Sacrifício em escala planetária
O caráter sacrificial do capitalismo também tem sido amplamente desenvolvido entre nós por estudos de pensadores como Franz Hinkelammert , Hugo Assmann , Jung Mo Sung , entre outros. O capitalismo é um sistema econômico que planeja o sofrimento humano de uns como efeito colateral necessário para manter o lucro e o crescimento de outros. A lógica do benefício próprio que se contrapõe à procura do bem comum se legitima como algo natural. A naturalização desta lógica leva a aceitar socialmente que os mais espertos e capazes gerenciem o sistema de modo que seu interesse individual seja o motor natural da produção. Esse interesse individual, enaltecido pelo liberalismo econômico como algo inerente à natureza humana, traz como consequência, também supostamente “natural”, que muitos devam ser sacrificados.
O sacrifício forma parte das planilhas, das metas e dos resultados de ministérios, das corporações e das empresas que projetam um índice necessário de sacrifício humano para que o sistema funcione. Planeja-se um índice médio de desempregados, de pessoas que poderão morrer sem atendimento médico, de falta de moradia, de educação precária, etc. O sacrifício dessas pessoas é um efeito colateral planejado para que o sistema funcione corretamente. O capitalismo projeta um sacrifício em escala planetária, que o torna a religião mais universal que nunca existiu.
Objetivação do ser humano
O paradoxal do caráter sacrificial é que, em plena modernidade, o capitalismo retroagiu a economia política ao debate teológico ancestral entre os ídolos e o Deus da vida. Na revelação bíblica esse debate está bem caracterizado. O que diferencia o Deus da Vida dos ídolos é que estes necessitam dos sacrifícios humanos para existirem, enquanto o Deus da Vida nega o sacrifício como elemento constitutivo de sua revelação. Deus detém o braço de Abraão no sacrifício do filho. René Girard  foi um pensador que destacou o caráter antissacrificial da cruz de Jesus. Sua morte política é a negação do valor do sacrifício porque assumiu o sacrifício em si mesmo para invalidá-lo. 
O capitalismo é um sistema econômico que emula o ídolo. Subsiste a base do sacrifício humano. Sem o sacrifício humano, o capitalismo, como o ídolo, desapareceria. A genealogia do sacrifício coloca em questão muitas teologias do sacrifício, assim como desmascara o caráter sacrificial inerente ao capitalismo como sistema que gera o sofrimento humano, dele se nutre e sem ele definha.
Desde uma outra perspectiva, já Marx  tinha apontado para o caráter idolátrico do mercado ao analisar a dimensão fetichista da mercadoria capitalista. No capitalismo, o fetichismo da mercadoria se desenvolve num duplo aspecto. No modo de produção capitalista, a mercadoria é um fim, e a mão de obra, um meio. O ser humano é objetivado, sacrificado no processo produtivo, como mero recurso material e biológico para a obtenção do fim primário da produção: a mercadoria. A mercadoria se humaniza e a vida humana se mercantiliza. 
O ocaso das utopias e a ascensão da mercadoria
Num outro aspecto, a mercadoria capitalista incorporou um valor simbólico de troca para além do valor de uso. A compra e possessão da mercadoria oferecem muito mais que seu valor material de uso. A mercadoria adquire, no atual modelo de mercado, um valor humano fetichista. Ela oferece felicidade, status, segurança, paz, alegria, bem-estar, etc. A mercadoria é portadora dos valores humanos mais nobres e utópicos. Numa época de niilismo pragmático, a mercadoria brilha como o novo horizonte utópico das aspirações sociais e individuais. De alguma forma podemos dizer que a nova utopia é a posse de mercadorias. A morte das utopias e das convicções fortes de nossas sociedades pós-metafísicas parece ter encontrado um ponto de escoamento da irrenunciável aspiração humana: a mercadoria. 
A mercadoria toma o lugar dos valores e ideais humanos, os absorve, oferecendo uma felicidade material concreta na sua posse e desfrute material. Ela é o novo fetiche que oferece a ilusão de uma alienação sob aparência de felicidade irrestrita. O fetiche da mercadoria criou a promessa de redenção no novo paraíso do consumo. O Éden bíblico foi substituído pelo hedonismo mercantil.
A humanização fetichista de mercadoria é proporcional à objetivação mercantil da vida humana. Este processo fetichista desemboca no inevitável sacrifício da vida humana em prol da mercadoria. Esse sacrifício também se faz num duplo aspecto.
1) O processo produtivo adquire uma matriz biopolítica em que a vida humana é sacrificada para atingir as metas. 
2) Na dinâmica de consumo, a vida humana é sujeitada por dispositivos de produção de desejos que, numa outra dimensão da matriz biopolítica, a tornam um meio útil para um fim eficiente.

IHU On-Line - Qual é a diferença entre o mercado medieval e o mercado hoje? Como se deu essa mudança de significados?
Castor Bartolomé Ruiz - Em primeiro lugar é conveniente firmar o princípio de que o mercado não é uma entidade natural com leis próprias. É uma instituição histórica criada a partir dos interesses em jogo. As chamadas leis do mercado são regulamentos e normatizações históricas criadas para seu funcionamento concreto. Da mesma forma que foram criadas, podem ser mudadas. Quanto mais complexas, mais difícil sua transformação. O mercado não é culpado de nada, nem é o salvador de ninguém. Ele é uma forma de organizar a produção, comercialização e relações econômicas entre pessoas e sociedades.
O mercado medieval não era uma instituição-chave da estrutura estamental daquelas sociedades, nem um dispositivo central da organização da sua estrutura de poder. Embora devêssemos fazer algumas distinções pertinentes sobre o mercado das ligas comerciais e os mercados das urbes, em linhas gerais poderia se dizer que o funcionamento do mercado medieval que se praticava nas urbes estava organizado em torno do princípio do bem comum.
Embora no marco de economias e sociedades muito menos complexas que as nossas, o mercado durante toda a Idade Média tinha o princípio do intercâmbio justo das mercadorias. O conceito de justiça era central ao mercado e ao intercâmbio. O mercado era um espaço em que se visava estabelecer relações justas através das trocas equitativas. Por exemplo, se impedia a especulação pela escassez. Havia uma regulação e um controle baseado no bem comum sob o critério da troca justa e do lucro justo. Este modelo de mercado seguia os princípios clássicos da filosofia política clássica do bem comum, mantidos pelo ideal cristão dominante de que todo governo deve visar ao bem coletivo e evitar ao máximo a especulação dos interesses privados. Por isso, os filósofos e teólogos medievais condenavam a usura no mercado e proibiam os juros por serem um mecanismo expropriatório injusto de riqueza alheia.
Esta concepção de mercado foi possível porque o mercado medieval era uma instituição periférica do sistema político daquelas sociedades. A injustiça estrutural que eivava as sociedades estamentais na Idade Média não utilizava o mercado como dispositivo e tecnologia, algo que irá mudar a partir do século XVII.
O egoísmo como estruturante do mercado
Atualmente, a noção de mercado em voga foi construída a partir das mudanças conceituais e estruturais acontecidas no século XVII na Europa. A emergência dos novos modos de produção baseados na acumulação privada de capital, assim como uma nova classe social dominante, a burguesia, desconstruiu o paradigma clássico do bem comum que legitimava os mercados medievais. Recuou os princípios do bem comum para as declarações formais do direito constitucional e liberou a economia dessa “intrusão”. O mercado, que era uma instituição periférica nas sociedades medievais, foi consolidado como um dispositivo central da nova política. Nascia a economia política.
O mercado foi ressignificado como se fosse uma entidade com natureza própria similar ao conceito de natureza humana criado nesse século. Assim, foi estruturado como uma entidade cuja natureza se rege pelo interesse próprio dos indivíduos. Ou seja, o egoísmo foi instituído como categoria antropológica da natureza humana que por sua vez estrutura o modo natural do mercado de se comportar. 
O modelo antropológico do interesse próprio se mostrou muito eficiente na legitimação dos novos dispositivos reguladores da economia. O mercado tornou-se um dispositivo regulador das relações sociais e políticas, tendo como eixo legitimador a naturalidade do interesse próprio. Sua eficiência consiste em haver conseguido legitimar a desigualdade social como algo natural. Os mecanismos de concentração de riqueza e do poder através da acumulação privada do capital é concomitante ao despojamento de acesso ao poder e à riqueza das grandes maiorias sociais. 
A desigualdade é produzida pelos mecanismos do mercado como algo normal. Naturalizam-se, por um lado, os dispositivos de concentração de poder em cartéis e oligopólios e, por outro, normaliza-se a necessidade das políticas sociais de sacrifícios inevitáveis, tudo referido a supostos dispositivos naturais de funcionamento do mercado. 
Criadores e criatura
Este modelo de mercado tem-se complexificado enormemente a ponto de não mais conseguirmos perceber onde começa a criatura que fizemos e até onde estamos sendo criados à sua imagem e semelhança. A criatura parece devorar seus criadores tornando-nos à sua imagem e semelhança. Para sobreviver, nos adaptamos às leis do mercado que nós criamos. Caso contrário, seremos incapazes de sobreviver. Por sua vez, as sociedades abandonadas à lógica da pura acumulação ilimitada imposta pelo modelo de mercado imperante encontram-se à mercê das decisões de poucas corporações que, administradas por uma minoria, conseguiram acumular poder e riqueza em escala planetária. 
A última crise do capitalismo financeiro ocorrida em 2008 é uma pequena amostra das consequências reais a que conduz a lógica do “livre” mercado. Utiliza-se falaciosamente o símbolo de “liberdade” para legitimar uma prática oligopolizadora do poder pelos mercados. Atualmente, sociedades inteiras encontram-se presas a políticas de sacrifícios extremos provocadas pela crise de solvência a que conduziu o modelo de “livre mercado” implementado pelos acordos de Washington no modelo neoliberal.

IHU On-Line - Pode-se dizer que o mercado hoje é algo como uma “entidade metafísica”? Por quê?
Castor Bartolomé Ruiz - Desde sua ressignificação simbólica pela modernidade, foi conferida ao mercado uma série de qualidades próprias de um “ente” natural. O conceito de “mão invisível” idealizado por Adam Smith foi o ponto de partida do agigantamento da autonomia do mercado separando da ação humana a lógica de seu funcionamento. O mercado foi dotado de uma potência própria, semelhante à natureza científica dos objetos, cujas leis existem além da vontade humana e por ela devem ser respeitadas. Ele foi simbolizado com um naturalismo próprio que deve ser acatado pelas políticas dos Estados e as decisões sociais para que possa funcionar corretamente. 
Apresenta-se o mercado como onipresente, pois está em todas as partes. Ele se mostra onipotente, pois consegue regular todas as relações econômicas, sociais, políticas, até afetivas. Ele é justiceiro porque premia os bons investidores e castiga os maus ou ineficientes. Estes são atributos divinos que se imanentizaram nesta instituição.
Embora cada vez as teorias críticas do mercado tenham maior ressonância, face às crises que desmascaram a falácia do seu naturalismo, continua a persistir o discurso hegemônico que caracteriza o mercado como uma entidade. Nos discursos vigentes dos dirigentes políticos e empresariais é comum falar do mercado com artigo determinado, como um sujeito. Atribui-se ao mercado propriedades e qualidades de um sujeito transcendental. O mercado regula, o mercado define, o mercado estipula. Inclusive atribuem-se ao mercado sentimentos: o mercado está nervoso, o mercado está inseguro, o mercado está feliz, etc. 
Ainda que muitas destas metáforas sejam captadas em seu sentido metafórico, também é verdade que permanece um tipo de naturalização desta criatura chamada mercado, pela qual parece que nos confrontamos com uma entidade metafísica. Esta percepção é parte da estratégia ideológica (consciente ou não) pela qual, ao naturalizar um dispositivo de poder, mantém o caráter sacral, se legitima socialmente seu funcionamento e se tornam aceitáveis as consequências exigidas. Lembremos que durante séculos foi naturalizada a origem divina do poder, assim como agora se naturaliza a origem extrínseca do mercado. A consequência desta naturalização é que se evita a consciência crítica, precondição para sua transformação histórica.
Sob a capa da secularização
O caráter metafísico com que foi revestido o mercado remete às implicações políticas da secularização moderna. Agamben analisa criticamente o processo moderno de secularização. A modernidade pretendeu libertar o ser humano de determinações externas, como a religião, porém, sob aparência de secularização, em muitas de suas instituições e discursos imanentizou os dispositivos da sacralidade. A sacralidade se caracteriza por separar a realidade do uso comum das pessoas colocando-a num outro patamar, sagrado, em que se tornam inatingíveis para a vontade humana. Quando algo ou alguém é declarado sagrado, se retira imediatamente do uso comum e fica consagrado ao uso especial de acesso restrito a especialistas. A sacralidade impõe o especialista no lugar do povo. Só as pessoas devidamente preparadas e reconhecidas poderão lidar com o sagrado. As pessoas comuns se caracterizam por sua incapacidade natural de aceder ao uso das coisas sagradas. A sacralização impede o acesso das pessoas comuns àquilo que é sagrado porque está fora de seu alcance.
A modernidade racionalizou a realidade pretendendo dessacralizá-la através do dispositivo da secularização. Porém, em muitos casos, a secularização manteve instituições e realidades na condição de entidades inacessíveis à ação humana. Ou seja, sob a aparência de racionalização manteve o dispositivo da separação e dos especialistas como elementos constitutivos da racionalidade de muitas instituições modernas. O mercado, o Estado, a nação, a lei, as formas de governo, congresso, senado, circulação do capital, entre outros, aparecem revestidos de uma racionalidade própria que deve ser respeitada por ter uma natureza intrínseca que excede a ação humana. Parece que só especialistas podem conhecer e operar com essas racionalidades imanentes que a pessoa comum não compreende, ou não consegue atingir com suas decisões. São realidades sociais secularizadas que imanentizaram o dispositivo da sacralidade na forma de racionalidade intrínseca inacessível ao povo comum impedindo que a ação política dos sujeitos vulgares (vulgo) possa transformá-las. 
Agamben propõe a retomada crítica da ação humana sobre as instituições econômicas, políticas e sociais que sob uma capa de secularizadas permanecem na condição de inacessibilidade para ação social direta. Para tanto, propõe a categoria da profanação. Aquilo que se profana é retirado de sua condição de inacessibilidade sacral para voltar ao domínio do uso comum das pessoas.  
Profanação como categoria filosófica
As categorias teológicas oferecem a possibilidade de pensar uma filosofia crítica inovadora além da mera categorização conceitual habitualmente desenvolvida pelo pensamento ocidental. Esta perspectiva filosófica foi apontada agudamente por Benjamin nas suas teses sobre filosofia da história. Na tese I apresenta a teologia como se fosse um anão feio e escondido na penumbra da história porque os pensadores modernos não a valorizam. Porém, mesmo relegada à penumbra, a teologia continua a estar presente na trama dos fios da ação histórica. Agamben, com suas diferenças, também reflete esta perspectiva filosófica que retoma da teologia sugestões instigantes para pensar criticamente nossa realidade. 
O uso político do conceito de profanação que Agamben propõe, ainda que seja uma contribuição inovadora, nos permite encontrar rastros claros de uma genealogia clássica desse conflito. Se tomamos como referência duas grandes figuras históricas como Sócrates e Jesus Cristo, perceber-se-á que, em ambos os personagens, a sentença oficial que os condenava à morte argumentava que foram profanadores. Sócrates profanou a lei da cidade corrompendo a juventude com novas ideias. Jesus profanou permanentemente as principais instituições de sua sociedade. Afirmou que a lei é para o homem, e não o homem para a lei; profanou o sábado, curando quando estava proibido; profanou o templo, expulsando os vendilhões; profanou deixando-se tocar por mulheres impuras, etc. A profanação foi uma estratégia utilizada, entre outros, por Sócrates  e Jesus, em sociedades donde a sacralidade operava como dispositivo altamente eficiente para evitar que as pessoas comuns tivessem o poder de aceder ou transformar a realidade.

IHU On-Line - Tomando os escritos de Foucault em consideração, é correto afirmar que atualmente a economia funciona como normalizadora dos sujeitos? Por quê?
Castor Bartolomé Ruiz - Foucault dedicou uma parte significativa de suas últimas pesquisas a perfazer a genealogia dos dispositivos de governo da modernidade, que ele caracterizou como sendo dispositivos biopolíticos. Entre os dispositivos biopolíticos, Foucault destaca a segurança e também a economia. No curso ministrado entre 1978-1979, intitulado Nascimento da biopolítica, Foucault desenvolveu a genealogia da economia política moderna e contemporânea, chegando a analisar a genealogia do modelo neoliberal de economia.
A tese de Foucault é que os métodos modernos de governo, especialmente a economia, provocaram uma virada conceitual e prática em relação com a vida humana. Nas sociedades antigas, a vida humana natural, denominada pelos gregos de zoé, não era objeto de governo porque se considerava que era regida pelas leis ontológicas da natureza sobre as quais a vontade humana não tem poder. A modernidade, em especial os discursos econômicos, percebeu que o governo dessa vida humana natural, a vida biológica, era muito importante para a produção. Os novos conhecimentos de anatomia, estatística, organização espacial, etc., foram se deslocando paulatinamente para a produção de discursos sobre o aprimoramento do governo da vida humana no processo produtivo, nas instituições, pelo Estado. 
Por exemplo, as modernas linhas de produção das fábricas surgem a partir de estudos sobre anatomia humana, o espaço e sua relação com a eficiência produtiva. O que está em jogo nestes discursos é a instrumentalização da vida humana como meio útil para um fim outro: o lucro. A vida humana é objetiva como recurso natural do qual se podem extrair benefícios, lucros, eficiência, produtividade. O dispositivo biopolítico da economia coloca a questão de como governar de forma útil a vida humana, não para benefício da vida, senão para consecução de lucros. Essa lógica foi derivando numa crescente sujeição da vida humana ao conceito de recurso biológico com potencialidades inesgotáveis. Evidentemente que esse processo acontece num campo de tensões, resistências, cessões e ajustes de todas as partes implicadas. Mas o dispositivo biopolítico almeja o máximo de lucratividade com o mínimo de custo. Nessa equação a vida humana é capturada como recurso útil, e o nível de exploração será inversamente proporcional à sua resistência. Neste marco, o poder soberano, próprio das sociedades autoritárias pré-modernas, não mais era eficiente para governar capilarmente a vida humana. Fazia-se necessário desenvolver outras técnicas e dispositivos de governo que não fossem mais percebidos como autoritários, no sentido clássico do termo. Era prioritário criar dispositivos e técnicas que governassem a liberdade humana. Esta aparente aporia, governar a liberdade, constitui-se no âmago das técnicas de administração modernas, que são técnicas de governo da liberdade. Elas são eficientes quando conseguem que os sujeitos se sujeitem “livremente” às necessidades institucionais ou estruturais. 
Foucault alcunhou uma expressão para indicar a diferença entre o poder soberano e o biopoder, que se tornou muito conhecida: O poder soberano faz morrer e deixa viver, o biopoder faz viver e deixa morrer.
Sujeição ou exclusão
Para conseguir este complexo objetivo, governar a liberdade, utilizou-se, entre outras, a técnica da norma. A norma, diferentemente da lei, tende a regular capilarmente os comportamentos. A norma estabelece os procedimentos corretos para que um sujeito seja aceito numa instituição ou processo. Ela regula, no mínimo detalhe possível, todas as operações a serem desenvolvidas no tempo certo, no espaço concreto, com a eficiência desejada, atingindo as metas propostas, etc. O dilema do sujeito moderno é aceitar as normas que o sujeitam ou ser excluído. Ele deve decidir, mas a alternativa que lhe resta, a exclusão, é sempre a pior, por isso tende a sujeitar-se aos processos de normalização de conduta exigidos. 
Não cabe dúvida de que vivemos em sociedades de normalização. Todas as instituições aprimoraram ao máximo as técnicas de normatização dos sujeitos nos diversos aspectos de sua vida. O tempo, o espaço, os resultados, a produção, os deslocamentos, etc., tudo é normatizado ao detalhe para que os indivíduos se ajustem institucionalmente às metas desejadas. Caso contrário, estão fora da normalidade definida, o que acarretará sua exclusão institucional por não ajustar-se à norma exigida.
Leia mais...
Homo sacer. O poder soberano e a vida nua. Revista IHU On-Line, edição 371, de 29-08-2011;
O campo como paradigma biopolítico moderno. Revista IHU On-Line, edição 372, de 05-09-2011;
O estado de exceção como paradigma de governo. Revista IHU On-Line, edição 373, de 12-09-2011;
A testemunha, um acontecimento. Revista IHU On-Line, edição 375, de 03-10-2011;
A testemunha, o resto humano na dissolução pós-metafísica do sujeito. Revista IHU On-Line, edição 376, de 17-10-2011;
Genealogia da biopolítica. Legitimações naturalistas e filosofia crítica. Revista IHU On-Line, edição 386, de 19-03-2012;
A bios humana: paradoxos éticos e políticos da biopolítica. Revista IHU On-Line, edição 388, de 09-04-2012;
A economia e suas técnicas de governo biopolítico. Revista IHU On-Line, edição 390, de 30-04-2012;
O advento do social: leituras biopolíticas em Hannah Arendt. Revista IHU On-Line, edição 392, de 14-05-2012;
O trabalho e a biopolítica na perspectiva de Hannah Arendt. Revista IHU On-Line, edição 393, de 21-05-2012;
Giorgio Agamben, genealogia teológica da economia e do governo. Artigo de Castor Bartolomé Ruiz na Revista IHU On-Line edição 413, de 01-04-2013;
A verdade, o poder e os modelos de subjetivação em Foucault. Publicado nas Notícias do Dia, de 25-09-2013, no sítio do Instituto Humanitas Unisinos;
- Genealogia do governo e da economia política. Artigo de Castor Bartolomé Ruiz na Revista IHU On-Line edição 437, de 17-03-2014;
O poder pastoral, a economia política e a genealogia do Estado moderno. Artigo de Bartolomé Ruiz na Revista IHU On-Line edição 446, de 16-06-2014;
Forma de vida e os dispositivos biopolíticos de exceção e governamentalização da vida humana. Entrevista com Castor Bartolomé Ruiz na Revista IHU On-Line edição 450. 

“A mobilização é a única garantia de que vamos conseguir colocar em prática nossas propostas”, diz Luciana Genro durante lançamento do Programa de Governo

“A mobilização é a única garantia de que vamos conseguir colocar em prática nossas propostas”, diz Luciana Genro durante lançamento do Programa de Governo

Por Redação #Equipe50
Crédito: Divulgação PSOL
Crédito: Divulgação PSOL
A candidata do PSOL à Presidência da República, Luciana Genro, lançou na tarde desta terça-feira (23), em São Paulo, o seu Programa de Governo (baixe aqui em PDF!). Durante o evento, Luciana disse que propostas representam uma defesa da ruptura com os atuais sistemas econômico e político. “Aqui estamos apresentando propostas radicais. Sim, radicais, mas não no sentido estereotipado e pejorativo da palavra, mas no sentido de propostas que vão à raiz dos problemas. Nós defendemos mudanças estruturais importantes, como a reforma agrária, a reforma urbana, o combate à homofobia, a defesa do casamento civil igualitário, a reforma tributária. Tudo isso é importante para a população, mas os partidos do sistema são incapazes de defender, pois não têm coragem de enfrentar os interesses do capital financeiro”, afirmou para um público de jornalistas, apoiadores e militantes.
O documento foi apresentado pela própria candidata, pelo coordenador geral da campanha, Luiz Araújo, e pelo coordenador de Programa de Governo, Mauricio Costa. O professor da USP, Vladimir Safatle, e o vice de Luciana, Jorge Paz, também estiveram presentes.
Luciana disse ainda que para colocar em prática tais mudanças a participação popular é fundamental. “Nosso projeto é, sim, um projeto de ruptura, é, sim, um projeto de enfrentamento, mas é também um projeto factível, pois pressupõe contrariar interesses minoritários para atender os interesses da maioria do povo. Por isso o apoio da população é tão importante. Digo que a mobilização é a única garantia de que vamos conseguir colocar em prática as nossas propostas. Essa ruptura só será possível com pressão popular”, afirmou a presidenciável.
Para encerrar, Luciana falou que independentemente do resultado das eleições, as lutas do PSOL continuarão. “As bandeiras que defendemos no nosso programa não são bandeiras apenas do PSOL, são lutas de uma sociedade que quer mais democracia, mais e melhores direitos. A votação que o PSOL tiver nas eleições é a expressão da força dessas bandeiras, da força da esquerda”, declarou.
“Esse programa inova no conteúdo e na forma, pois parte do processo de consulta de toda a sociedade civil. Ele deixa claro que não é possível fazer as mudanças que propomos sem mexer na estrutura”, disse o coordenador geral da campanha, Luiz Araujo.
Crédito: Divulgação PSOL
Crédito: Divulgação PSOL
Já Safatle, resumiu o programa de Luciana Genro da seguinte forma: “Esse é o programa da esquerda brasileira. O PSOL não é uma esquerda sazonal, é uma esquerda comprometida com suas propostas. Um partido que consegue ver e mostrar onde está o sofrimento social. Aqui não existe generalização, as propostas são diretas e claras. Propostas que muitos têm até medo de pensar, mas que boa parte da população sabe que são factíveis”, afirmou o filósofo, que também colaborou com a construção do programa.
O Programa de Governo de Luciana Genro foi construído por movimentos sociais, intelectuais, setoriais do PSOL e diversos segmentos da sociedade civil. Seminários programáticos organizados pela Fundação Lauro Campos, coordenados por Luciana Genro e pela dirigente partidária e ex-deputada federal, Maninha, foram o ponto de partida. Os encontros realizados em dez cidades brasileiras, contaram com nomes como Lucio Gregori, especialista em mobilidade urbana.
O PSOL também colheu apoios da sociedade via internet, através da Plataforma 50, que recebeu quase 200 contribuições de cidadãos de todo o Brasil. O mandato do deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) apresentou contribuições substanciais no tema da Educação. As propostas para a população LGBT tiveram contribuições do deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ). O Greenpeace colaborou nos programas de mobilidade urbana e meio ambiente. Para o eixo de habitação, Luciana incorporou bandeiras do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto). Já o programa de reforma política foi construído a partir de propostas do deputado Chico Alencar (PSOL- RJ), da Coalizão Democrática por Eleições Limpas e da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política.
As demandas estão organizadas em um sistema de propostas concretas divididas em 20 áreas diferentes, além das contribuições realizadas por movimentos de juventude e de negros e negras, que foram incorporadas, tais quais foram redigidas e apresentadas à campanha.
“A grande diferença desse programa para os que vimos até hoje é uma inversão de prioridades. Aqui, priorizamos a maioria e destacamos a necessidade de combater a desigualdade. Nós criamos uma plataforma que desse voz àqueles que nunca são ouvidos”, disse Maurício Costa, coordenador do Programa.

O domínio avassalador da economia sobre a política

O domínio avassalador da economia sobre a política

“A animalização do humano é uma característica fundamental da política moderna e contemporânea, o que justificaria ainda mais que falássemos em zoopolítica, e não em biopolítica”, pondera Cláudio Oliveira

Por: Márcia Junges e Luciano Gallas

“Dentro da perspectiva de Agamben, poderíamos dizer que a ideia de estado mínimo e da mão invisível do mercado estariam relacionadas com a decadência da dimensão política enquanto tal, na medida em que, no capitalismo, as coisas parecem se resolver apenas desde uma perspectiva econômica. A oposição entre econômico e político já está dada desde o livro I da Política de Aristóteles. O que Agamben nos ensina, desde o livro I de Homo Sacer, é que, ao contrário do que acreditava Aristóteles, que julgava que o econômico deveria estar submetido ao político, na modernidade temos a total submissão da política ao econômico, quando não simplesmente uma eliminação do primeiro pelo segundo. É de algum modo o sentido de toda a reflexão de Marx, sobretudo em O Capital”, afirma o filósofo Cláudio Oliveira.
Nesta entrevista, concedida por e-mail à IHU On-Line, o pesquisador analisa a obra de Giorgio Agamben e sua relação com o trabalho de pensadores dos mais variados ramos do conhecimento, debatendo as interações entre economia e política no atual sistema de produção hegemônico. “O que aconteceu no mundo moderno não foi propriamente uma cisão entre política e economia, mas um domínio avassalador da primeira pela segunda, a ponto de reduzir a primeira, a política, a quase nada, ou, para usar um termo muito na moda, a um problema de gestão. Creio que o modo como se deu esse processo foi explicado do modo mais radical até hoje por Marx, quando nos mostrou que, a partir do capitalismo, os homens deixam de se encontrar no mercado, na medida em que são as mercadorias, e não os homens, que passam a se encontrar no mercado. Algo que Marx chamou de o fetichismo da mercadoria”, enfatiza. 
Cláudio Oliveira da Silva é graduado, mestre e doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Atualmente, é professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal Fluminense - UFF. É membro, desde a sua fundação, do grupo de trabalho Filosofia e Psicanálise da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia - ANPOF e da International Society of Psychoanalysis and Philosophy. Integra o Conselho Editorial da Coleção Filô, da editora Autêntica, na qual dirige a série Agamben — é o tradutor para o português usado no Brasil do livro A comunidade que vem (“La Comunità che viene” - Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013). 
Confira a entrevista.

IHU On-Line - A partir das ideias de Agamben  em O Reino e a glória (Il Regno e la Gloria. Per una genealogia teologica dell’economia e del governo - São Paulo: Boitempo Editorial, 2011), em que medida o capitalismo pode ser compreendido como uma zoopolítica?
Cláudio Oliveira - Na verdade, a noção de zoopolítica foi por mim desenvolvida a partir do primeiro volume de Homo Sacer, "O poder soberano e a vida nua" (Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010), e não a partir de "O Reino e a Gloria" [segundo volume de Homo Sacer]. Após demonstrar já na Introdução de "O poder soberano e a vida nua" que há, em Aristóteles , no livro I da "Política", uma distinção entre os termos gregos bíos e zoé, Agamben relaciona a discussão aristotélica com as investigações foucaultianas sobre a biopolítica. Mas o estranho é que, como o mostra o próprio Agamben, é o termo zoé que caracterizaria aquilo que hoje chamamos de vida biológica, enquanto o termo bíos estaria relacionado, segundo Aristóteles e de acordo com o próprio uso dessa palavra entre os gregos antigos, não com a vida que nós chamamos indevidamente de "biológica", mas com aquela qualificada politicamente. A vida que nós chamamos hoje, indevidamente, de "biológica" deveria ser chamada, seguindo o sentido dos étimos gregos, de "zoológica". Em grego bíos não diz respeito à vida biológica, mas à vida politicamente qualificada; bíos significa um modo de vida ou o modo como vivemos a vida, e não a vida no sentido biológico do termo. Estranhamente, ao se criar uma nova ciência na modernidade que estudava o fenômeno da vida, a biologia, se partiu do étimo grego que não tinha nada a ver com esse aspecto da vida. Foucault , ao criar o termo biopolítica, não tem como referência o sentido grego da palavra bíos, mas já o sentido dado pelo surgimento da biologia como ciência na modernidade; ou seja, a biopolítica, para Foucault, é uma política em que a biologia tem um papel fundamental.
Agamben, no entanto, diferentemente de Foucault, tem total consciência do sentido grego do termo, mas, mesmo assim, para se manter referido a Foucault e às discussões que ele lançou, manteve o termo biopolítica. A meu ver, se levarmos em consideração o sentido etimológico do termo, o mundo moderno e o capitalismo como seu "modus vivendi" fundamental, deveria ser entendido como uma zoopolítica, e não como uma biopolítica. Um outro argumento nesse sentido é que tanto em Foucault como em Agamben, assim como em Hannah Arendt , a animalização do humano é uma característica fundamental da política moderna e contemporânea, o que justificaria ainda mais que falássemos em zoopolítica, e não em biopolítica. O autor que talvez mais tenha se aproximado da ideia de uma zoopolítica é Peter Sloterdijk , em seu livro Regras para o parque humano.

IHU On-Line - Dentro desta perspectiva, como podemos compreender o estado mínimo e a “mão invisível” do mercado?
Cláudio Oliveira - Dentro da perspectiva de Agamben, poderíamos dizer que a ideia de estado mínimo e da mão invisível do mercado estaria relacionada com a decadência da dimensão política enquanto tal, na medida em que, no capitalismo, as coisas parecem se resolver apenas desde uma perspectiva econômica. A oposição entre econômico e político já está dada desde o livro I da Política de Aristóteles. O que Agamben nos ensina, desde o livro I de "Homo Sacer", é que, ao contrário do que acreditava Aristóteles, o qual julgava que o econômico deveria estar submetido ao político, na modernidade temos a total submissão da política ao econômico, quando não simplesmente uma eliminação do primeiro pelo segundo. É de algum modo o sentido de toda a reflexão de Marx , sobretudo em "O Capital".

IHU On-Line – Há uma cisão entre ética e economia? Como se deu esse processo?
Cláudio Oliveira - Na verdade não se trata, a meu ver, de uma cisão, nem de uma cisão entre ética e economia. A relação fundamental seria entre política e economia, a ética fazendo parte de um domínio dentro da política. O que aconteceu no mundo moderno não foi propriamente uma cisão entre política e economia, mas um domínio avassalador da primeira pela segunda, a ponto de reduzir a primeira, a política, a quase nada, ou, para usar um termo muito na moda, a um problema de gestão. Creio que o modo como se deu esse processo foi explicado do modo mais radical até hoje por Marx, quando nos mostrou que, a partir do capitalismo, os homens deixam de se encontrar no mercado, na medida em que são as mercadorias, e não os homens, que passam a se encontrar no mercado. Algo que Marx chamou de o fetichismo da mercadoria. 

IHU On-Line - Quais são os nexos que unem a biopolítica à economia?
Cláudio Oliveira - Esses nexos são muitos, e o próprio Foucault se deu conta deles, embora não os tenha desenvolvido a fundo. Mas ele nos mostra que uma biopolítica é condição fundamental para a instauração do capitalismo. A obra de Agamben é uma oportunidade para nos aprofundarmos nessa questão. Eu diria que o capitalismo é uma biopolítica (ou uma zoopolítica, se quisermos ser mais precisos), na medida em que o indivíduo e o cidadão se tornam para o governo um problema econômico.

IHU On-Line - Que conexões podem ser percebidas entre Lacan  e Agamben?
Cláudio Oliveira - Na obra de Agamben, elas começam a aparecer já em seu segundo livro, Estâncias (Belo Horizonte: Editora UFMG, 2007), no terceiro ensaio do livro, que é dedicado, dentre outros, a Jacques Lacan, e onde Agamben se utiliza da teoria psicanalítica, sobretudo lacaniana, para construir sua própria teoria do fantasma ou da fantasia. Essa referência permanecerá em livros posteriores, como "Infância e História", mas tende a desaparecer depois, pelo menos de modo explícito. Em 1990, Agamben participou do Colóquio "Lacan avec les philosophes", promovido pelo Collège International de Philosophie, do qual Agamben era um dos diretores de Programa. Apresentou, na ocasião, um texto intitulado "Experimentum linguae", mesmo título que viria a dar ao prefácio à edição francesa de Infância e História. O texto apresentado no colóquio, no entanto, jamais foi publicado. Tenho tentado, nos últimos anos, convencer Agamben a publicá-lo, mas até agora meus esforços foram em vão. Acho que é um texto que permitiria esclarecer alguns pontos obscuros da relação entre Lacan e Agamben.
O pensamento de Agamben, seu trabalho e obra são tão próximos de Lacan que exatamente essa proximidade tem que nos deixar atentos. Existe um conhecimento — depois de muitos anos de certo convívio com Agamben, tenho noção disso — por parte de Agamben da literatura psicanalítica. Um conhecimento por parte dele de certo Freud , de certo Lacan, mas esse conhecimento não vai até o nível que imaginamos, pelo fato de vermos grandes coincidências. A meu ver, essas coincidências se devem menos a um conhecimento profundo da obra de Lacan ou de Freud por parte de Agamben, e mais a um certo conjunto de referências intelectuais compartilhadas no século XX: a antropologia estrutural de Lévi-Strauss , a linguística de Jakobson , a referência hegeliana , uma discussão com Foucault, com Derrida . A obra de Agamben constitui-se no mesmo terreno em que a psicanálise de Lacan se constituiu. Nesse cenário da filosofia do século XX — agora já do século XXI —, eu diria que a posição filosófica mais próxima da psicanálise lacaniana é a de Agamben, sem dúvida nenhuma. As possibilidades de fazer esse diálogo, então, são inúmeras.

IHU On-Line - Quais são as ideias centrais da obra de Agamben “A comunidade que vem”?
Cláudio Oliveira - É difícil definir quais são as ideias centrais de um livro como "A comunidade que vem". Há, sem dúvida, algumas noções que se repetem ao longo do livro, como, por exemplo, a noção de "qualquer", que, não por acaso, é precisamente aquela que dá título ao primeiro capítulo do livro. A ideia central, embutida no uso dessa noção, poderia ser então descrita assim: qual é o estatuto dos indivíduos singulares numa comunidade por vir. Uma série de outras noções são então convocadas a fim de auxiliar o trabalho de descrição do que seria essa comunidade, tais como as noções de "limbo", de "exemplo", de "exterior", dentre tantas outras. O que essas noções teriam em comum é o fato de todas elas porem em questão a ideia tradicional de comunidade, enquanto reunião de semelhantes fundada em uma noção de identidade. É impressionante como Agamben, neste livro, se servirá de referências as mais díspares, como a teoria dos conjuntos, a ideia de uma sociedade sem classes, os cartoons, as discussões teológicas sobre o princípio de individuação, etc.

IHU On-Line – Que desafios foram enfrentados na tradução desta obra?
Cláudio Oliveira - O desafio maior, como sempre, é manter-se fiel ao original, sobretudo no caso de uma obra de grande aventura literária, como "A comunidade que vem". É sempre também um desafio descobrir as referências de Agamben, já que em muitos de seus livros ele faz citações sem dar referências bibliográficas.

IHU On-Line - Qual é a relação entre mística e linguagem em Giorgio Agamben?
Cláudio Oliveira - A questão da mística não é uma questão que poderíamos considerar central na obra de Giorgio Agamben. Eu diria que, embora fundamental, ela é uma questão sub-reptícia em sua obra: uma questão de fundo, essencial, mas que só ocasionalmente vem à frente. A questão da linguagem, ao contrário, é aquela que o próprio Agamben define como a questão que ele quis pensar obstinadamente, como ele diz no prefácio que escreveu, em 1989, para a edição francesa de Infância e História: “Se para todo autor existe uma interrogação que define o motivum do seu pensamento, o âmbito que essas perguntas circunscrevem coincide sem resíduos com aquele em direção do qual se orienta todo o meu trabalho. Nos livros escritos e naqueles não escritos, eu não quis pensar obstinadamente senão uma só coisa: o que significa ‘há linguagem’, o que significa ‘eu falo’?”.
É interessante notar que, embora uma questão sub-reptícia, a questão da mística, em Agamben, é uma questão que insiste e aparece, em geral, relacionada à questão da linguagem ou a questões que estão, de algum modo, relacionadas à questão da linguagem. Desenvolvi esse tema numa conferência que deve ser publicada em breve sob o título "Mística e Linguagem". Tratava-se de um encontro da sociedade ibero-americana de neoplatonistas, mas eu quis participar para mostrar que essa é uma questão que insiste não só em Agamben, mas também em Lacan. Agamben, aliás, em sua conferência inédita sobre Lacan, feita durante o colóquio Lacan avec les philosophes, lembra que Lacan quis que os seus "Escritos" fossem colocados entre os escritos dos místicos. Seria impossível reproduzir aqui toda a argumentação que eu desenvolvo na conferência citada, mas a ideia fundamental é a de que o místico não é algo que a linguagem não alcançaria a não ser através de uma experiência mística, mas, ao contrário, que isso que é o inalcançável para a linguagem, e, portanto, místico para ela, é ela mesma enquanto tal.
Leia mais...
O inédito de Agamben. Artigo de Cláudio Oliveira publicado no sítio do Instituto Humanitas Unisinos - IHU em 25-11-2012.

Uma análise crítica do governo Dilma: a quem este governo atende em primeiro lugar?

Uma análise crítica do governo Dilma: a quem este governo atende em primeiro lugar? Entrevista especial com Ivo Lesbaupin

“O governo atual tem implementado outras políticas durante o seu mandato — algumas das quais são estruturantes — e é possível prever que, se houver um segundo mandato, elas serão mantidas, já que não houve nenhuma avaliação crítica de sua parte”, adverte o sociólogo.
 Foto: ordemouregresso.blogspot.com.br
Uma semana antes das eleições presidenciais que indicarão os rumos do país nos próximos quatro anos, o sociólogo Ivo Lesbaupin faz um balanço dos últimos 12 anos de gestão petista à frente da Presidência da República, e é enfático: “É preciso superar a concepção neoliberal, centrada no capital financeiro (bancos, investidores financeiros), assim como a concepção neodesenvolvimentista, que financia com recursos públicos grandes empresas privadas. Interromper o processo de privatização de serviços públicos e de nossas riquezas naturais (entre as quais o petróleo)”.
Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail,Ivo Lesbaupin enfatiza que os avanços da última década foram pontuais na área social, com a redução da extrema pobreza, redução do desemprego, aumento da renda dos trabalhadores e maior acesso a bens de consumo. Contudo, a lista de críticas do sociólogo às políticas adotadas supera as benfeitorias dos governos Lula e Dilma e as compara ao que ele denomina de “uma política de direita, isto é, políticas que atendem aos interesses dos grandes grupos econômicos, políticas prejudiciais à grande maioria do povo brasileiro e que comprometem o futuro do país”. E acrescenta: “O problema é saber por que deram continuidade a várias políticas daquele governo (FHC)”.
Lesbaupin pontua, entre suas críticas, a não auditoria da dívida pública, que é “uma exigência da Constituição de 1988”, e que garante que “40% do orçamento público continuam a ir para os ricos. (...) A dívida externa chegou, em dezembro de 2013, a 485 bilhões de dólares, e a dívida interna, a 2 trilhões e 900 bilhões de reais. Em suma, o destino de quase metade do orçamento é a pequena camada mais rica do país — que são aqueles que recebem os juros da dívida —, além dos credores externos. Enquanto isso, apenas 5% vão para a saúde e 4% para a educação”.
A “aliança do governo com o agronegócio” também desencadeou uma série de consequências, como o esquecimento da reforma agrária, políticas de incentivo aos transgênicos, que “são plantados livremente no Brasil”, o uso crescente de agrotóxicos nas lavouras brasileiras, e “um processo de abandono, descaso e destruição dos povos indígenas”, porque “o governo ressuscitou a política indigenista da ditadura, segundo a qual ‘o índio não pode atrapalhar o progresso do país’”.
Eleito também por conta de suas críticas às políticas privatizantes do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – FHC, o governo atual “retomou com força as privatizações. (...) O governo FHC quebrou o monopólio da Petrobras e 60% das ações desta empresa estão hoje em mãos privadas. O governo Lula não reverteu este processo. O governo FHC iniciou em 1997 o leilão das áreas de exploração do petróleo. Os governos Lula e Dilma não interromperam os leilões, apesar dos protestos dos petroleiros. O governo Dilma realizou — contra a oposição de todos os movimentos sociais — o primeiro leilão de um campo do pré-sal (Libra), cujas reservas são imensas”, lamenta.
Ivo Lesbaupin é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e coordenador da ONG Iser Assessoria, do Rio de Janeiro. É doutor em Sociologia pela Université de Toulouse-Le-Mirail, França. É autor e organizador de diversos livros, entre os quais O Desmonte da nação: balanço do governo FHC (1999)O Desmonte da nação em dados (com Adhemar Mineiro, 2002)Uma análise do Governo Lula (2003-2010)de como servir aos ricos sem deixar de atender aos pobres (2010).
Confira a entrevista.
 Foto:conline.ne10.uol.com.br
IHU On-Line - Que avaliação faz dos 12 anos do PT no governo e, particularmente, do governo Dilma? Houve avanços?
Ivo Lesbaupin - O Brasil avançou nos últimos anos. Reduziu fortemente o desemprego, promoveu transferência de renda para os setores mais pobres da população, valorizou o salário-mínimo acima da inflação.
Os dados mostram que, nos últimos dez anos, cerca de 30 milhões de brasileiros deixaram a extrema pobreza e os trabalhadores passaram a ter uma renda melhor, com acesso a bens de consumo aos quais não tinham antes. Este foi um salto significativo na nossa realidade social. O Brasil foi um dos países onde houve maior redução da pobreza neste período.
Houve avanços também na área da agricultura familiar, como a expansão do crédito rural e programas como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF e o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA, que vêm favorecendo pequenos agricultores no campo.
Além destes, poderíamos citar a revalorização do Estado, seriamente atacado durante o governo FHC; a política externa — este ponto é muito importante — se tornou mais independente, especialmente na relação com governos “progressistas” — os quais os EUA queriam isolar. O combate ao trabalho escravo se tornou sistemático.

“As grandes empreiteiras têm um peso determinante na decisão sobre as mais importantes obras públicas do país”

Há que apontar a vitória do Marco Civil da Internet e do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, ocorridas este ano.
Cabe ressaltar a instalação da Comissão da Verdade pelo governo Dilma. Mesmo considerando as limitações, como o curto tempo para o trabalho — dois anos —, a iniciativa veio preencher uma lacuna de quase 30 anos. A tentativa de relegitimar a ditadura que vinha ocorrendo foi por terra, em boa parte graças ao desencadeamento deste processo.
Poderíamos citar uma série de outras boas políticas desenvolvidas por este governo. Mas isto é apenas uma pequena parte do que ele está fazendo.
Digo com tranquilidade que os governos Lula e Dilma representaram um avanço em relação ao governo FHC, especialmente na área social (redução do desemprego, renda para os setores populares, salário-mínimo valorizado). O problema, como veremos adiante, é saber por que deram continuidade a várias políticas daquele governo [1].
IHU On-Line - Quais são as críticas que faz ao atual governo?
Ivo Lesbaupin - O governo atual tem implementado outras políticas durante o seu mandato — algumas das quais são estruturantes — e é possível prever que, se houver um segundo mandato, elas serão mantidas, já que não houve nenhuma avaliação crítica de sua parte.
  • Há um processo de abandono, descaso e destruição dos povos indígenas [2]. O governo ressuscitou a política indigenista da ditadura, segundo a qual “o índio não pode atrapalhar o progresso do país” (“progresso”, leia-se: agronegócio, mineradoras, hidrelétricas).
  • Não houve Auditoria da Dívida Pública, uma exigência da Constituição de 1988 (o que significa que 40% do orçamento público continuam a ir para os ricos). Nesta campanha eleitoral, esta possibilidade não foi nem mencionada.
  • As privatizações foram retomadas com força.
  • Não houve reforma agrária nem no governo Lula nem no governo Dilma, por causa da aliança com o agronegócio.
  • Os transgênicos são plantados livremente no Brasil (apesar de cientistas de todo o mundo já terem provado que são prejudiciais à saúde) [3].
  • Os agrotóxicos são vendidos e usados amplamente (e é sabido que eles prejudicam lenta e inexoravelmente a saúde da população, são um “veneno na nossa mesa”) [4]. O Brasil é o segundo maior “consumidor” de agrotóxicos no mundo.
  • Estão sendo construídas e estão projetadas dezenas de hidrelétricas, especialmente na Amazônia, atingindo os direitos dos povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos que habitam nestas localidades.
  • O agronegócio tem se expandido, com apoio do governo.
  • As grandes empreiteiras têm um peso determinante na decisão sobre as mais importantes obras públicas do país.
  • O sistema de energia elétrica é estruturado de tal forma que permite lucros enormes a empresas privadas e o povo é quem paga a conta [5].
  • Há uma profunda desconsideração com a questão ambiental, em razão do atendimento aos interesses do agronegócio, das empreiteiras e das mineradoras.
  • Os bancos continuam tendo lucros recordes, graças à política de juros altos, os juros reais mais altos do mundo [6].
  • Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES oferece recursos públicos para apoiar grandes empresas privadas. E os contribuintes não sabem quem são, quanto recebem, por que foram escolhidas (o grau de transparência é baixíssimo). E também não sabemos o que aconteceu com o S do BNDES.
  • O governo manteve um item da legislação previdenciária introduzido por FHC que prejudica seriamente os trabalhadores: o “fator previdenciário”. Os movimentos de trabalhadores lutam desde então para derrubar este “fator”. Em doze anos, nem Lula nem Dilma cederam às pressões dos trabalhadores: preferiram ceder ao capital privado.
Todas estas são políticas de direita, isto é, políticas que atendem aos interesses dos grandes grupos econômicos, políticas prejudiciais à grande maioria do povo brasileiro e que comprometem o futuro do país.

“Os bancos continuam tendo lucros recordes, graças à política de juros altos, os juros reais mais altos do mundo”

IHU On-Line - Quem são os grandes beneficiários das políticas atuais? A quem este governo atende em primeiro lugar?
Ivo Lesbaupin - Vejamos os três principais:
O capital financeiro (bancos e investidores financeiros) - Mais de 40% do orçamento geral da União se destinam ao pagamento da dívida pública, interna e externa, e de seus juros. A dívida externa chegou, em dezembro de 2013, a 485 bilhões de dólares, e a dívida interna, a 2 trilhões e 900 bilhões de reais cf. Auditoria Cidadã da Dívida. Em suma, o destino de quase metade do orçamento é a pequena camada mais rica do país — que são aqueles que recebem os juros da dívida —, além dos credores externos. Enquanto isso, apenas 5% vão para a saúde e 4% para a educação.
Orçamento Geral da União - Executado em 2013 
Total: R$ 1,783 trilhão
Elaboração: Auditoria Cidadã da Dívida – a partir de dados oficiais
As grandes empreiteiras - Há um outro setor privilegiado pelo governo: são as grandes empreiteiras — OdebrechtOAS,Camargo CorreiaAndrade Gutierrez. Elas estão em todas as grandes obras de infraestrutura do país, entre as quais as usinas hidrelétricas — Belo Monte é o exemplo mais notório. Mesmo quando não cumprem as condicionalidades às quais se comprometeram, continuam a receber recursos do BNDES para suas obras. Não sem razão, estão entre os principais contribuintes para as campanhas eleitorais.
O agronegócio - Para garantir a exportação de alguns produtos primários — elemento central de sua política econômica —, o governo mantém uma aliança com o agronegócio, razão pela qual não houve reforma agrária no país. E não há previsão, num futuro governo de continuidade, de que vá haver. Estamos vivendo um processo de reprimarização da economia do país — desde o governo FHC, a industrialização deixou de ser prioridade —, e o agronegócio é apresentado tanto pelo governo quanto pela grande mídia como o grande fator de desenvolvimento do país.
IHU On-Line – Como avalia as principais políticas contra a exclusão social?
Ivo Lesbaupin – Elas existem e tiveram efeitos significativos, como disse logo no início, e todos reconhecem o seu valor — até a oposição. Mas não ocupam o primeiro lugar no desembolso dos recursos públicos. Basta comparar o quanto vai para os juros da dívida (os ricos) e o quanto vai para as principais políticas sociais — saúde e educação (não sem razão, foram estas, além do transporte, as políticas que mais foram cobradas nas manifestações de junho de 2013).
Vejamos, porém, outros elementos também importantes.
Privatizações
O governo atual foi eleito em 2010 como a candidatura antiprivatista — oposta ao projeto neoliberal do PSDB. No entanto, a candidata eleita retomou com força as privatizações, passou a privatizar portos, aeroportos, rodovias e manteve a práticas das PPPs (parcerias público-privadas, outro nome para a privatização). Tem havido uma dura luta nas universidades públicas para manter os hospitais universitários sob gestão e controle públicos, contra um esforço do governo em passá-los para a gestão privada.
O governo FHC quebrou o monopólio da Petrobras e 60% das ações desta empresa estão hoje em mãos privadas. O governo Lula não reverteu este processo. O governo FHC iniciou em 1997 o leilão das áreas de exploração do petróleo. Os governos Lula e Dilma não interromperam os leilões, apesar dos protestos dos petroleiros. O governo Dilma realizou — contra a oposição de todos os movimentos sociais — o primeiro leilão de um campo do pré-sal (Libra), cujas reservas são imensas. O petróleo é nosso? Não, parte dele será das multinacionais estrangeiras que participam do consórcio que venceu este leilão. Note-se que, para garantir o leilão, o governo utilizou os mesmos métodos dos tempos de FHC (casos da Vale e da Telebrás): tropas militares e polícia, de um lado, e um batalhão de advogados, de outro, para derrubar liminares.
Desigualdade social
Muitos têm exaltado a redução da desigualdade social desde o início do governo Lula até hoje. O índice de Gini, que mede a desigualdade, tem melhorado ano a ano (embora, recentemente, a melhora tenha sido pequena).

“O governo manteve um item da legislação previdenciária introduzido por FHC que prejudica seriamente os trabalhadores: o ‘fator previdenciário’”

índice de Gini se baseia nos dados da PNAD, que capta a massa de rendimentos do trabalho e os pagamentos de benefícios monetários da política social. No entanto, uma outra parte da renda interna — juros, lucros, dividendos — não é captada por esta pesquisa [7]. É exatamente nesta parte que estão, por exemplo, os juros da dívida, recebida pelos mais ricos. Entre a camada mais rica da sociedade — entre 1 e 2% — e os mais pobres, a distância aumentou: a renda dos pobres melhorou, indubitavelmente, assim como o salário-mínimo, mas a renda dos mais ricos aumentou muito mais [8].
Por outro lado, o Brasil carrega outra “herança maldita”: o sistema tributário regressivo, que o governo FHC acentuou. Isto significa que, ao invés de distribuir renda, este sistema concentra renda. Nele, os pobres pagam proporcionalmente mais que os ricos, porque o peso maior está no imposto sobre o consumo. O governo Lula introduziu pequenas melhorias neste sistema, mas sem mexer na estrutura regressiva. Os governos Lula-Dilma não fizeram reforma do sistema tributário para acabar com esta estrutura reprodutora de desigualdade.
Um primeiro meio para mudar esta grave injustiça seria fazer uma reforma tributária, para tornar o sistema progressivo (os que recebem mais, pagam mais; o peso maior fica sobre a renda, não sobre o consumo).
Uma segunda maneira de reduzir a transferência de recursos para os ricos: seria a realização de uma auditoria da dívida pública. Ela provaria que uma parte da dívida que nós pagamos é irregular e isto diminuiria substancialmente a sangria de recursos públicos. A única auditoria que o país fez, em 1931, concluiu que 60% da dívida não tinham documentos que a comprovassem. O mesmo aconteceu mais de 70 anos depois, quando o Equador fez sua auditoria, em 2009: 65% da dívida eram eivadas de irregularidades. Como a nossa dívida externa foi constituída principalmente durante a ditadura civil-militar de 1964-1985, quando o Congresso não tinha acesso aos documentos, há indicações bem fundadas de que boa parte desta dívida é indevida. Só uma auditoria poderia verificar e comprovar.
Esta é uma exigência da Constituição de 1988, a qual nem o governo FHC nem os governos do PT puseram em prática. Com isso, favorecem os poucos privilegiados que ganham fortunas com a manutenção do status quo. E desfavorecem a imensa maioria que sofre as consequências de os recursos públicos não serem empregados onde deveriam: esta é a razão da falta de recursos suficientes para a saúde, a educação, o transporte, o saneamento básico, para os serviços públicos em geral.
IHU On-Line - O que seria uma alternativa à política que está sendo desenvolvida no Brasil?
Ivo Lesbaupin - Já adiantei alguns aspectos desta questão nas respostas anteriores [9]. 
Rever o modelo econômico - É preciso superar a concepção neoliberal, centrada no capital financeiro (bancos, investidores financeiros), assim como a concepção neodesenvolvimentista, que financia com recursos públicos grandes empresas privadas. Interromper o processo de privatização de serviços públicos e de nossas riquezas naturais (entre as quais o petróleo).
Se quisermos evitar o desastre ambiental que se anuncia, nós temos de construir umaeconomia baseada em nova concepção de desenvolvimento, que atenda às necessidades da população, respeitando os limites da natureza [10]. É preciso urgentemente mudar a matriz energética, para as energias renováveis, em particular a energia solar — o que deve ser uma iniciativa pública, não do capital privado. Nós poderíamos nos tornar o primeiro país do mundo em tecnologia e utilização da energia solar: depende unicamente de vontade política.

“Há que apontar a vitória do Marco Civil da Internet e do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, ocorridas este ano”

Temos de produzir aquilo de que precisamos e não depredar os bens naturais, tão fundamentais à nossa existência. Todos os alimentos de que necessitamos podem ser produzidos pela agroecologia — que é praticada em vários lugares do país, mas não é uma política nacional — e termos alimentos saudáveis, sem transgênicos, sem agrotóxicos.
Precisamos de uma política de transporte público condizente com a sustentabilidade (baseada principalmente em trilhos — trens, metrô, etc.), não centrada no automóvel, que garanta meios de locomoção dignos para atender às necessidades da maioria da sociedade.
As demais políticas, vou simplesmente enumerá-las, por limitação de espaço:
  • Defender e garantir os direitos dos povos indígenas;
  • Realizar uma Auditoria da Dívida Pública;
  • Promover uma Reforma do Sistema Político;
  • Realizar uma Reforma Tributária, para que o sistema se torne progressivo;
  • Estabelecer uma Taxa sobre Transações Financeiras;
  • Realizar a Reforma Agrária;
  • Promover a Reforma Urbana;
  • Democratizar os meios de comunicação;
  • Democratizar o poder judiciário;
  • Interromper os megaprojetos (hidrelétricas, transposição do rio São Francisco);
  • Implementar o controle social da gestão pública (inclusive da política econômica).
IHU On-Line - Deseja acrescentar alguma coisa?
Ivo Lesbaupin - Eu faria um último comentário: é legítimo que, na disputa eleitoral, se critiquem outros candidatos por representarem setores, defenderem políticas de direita ou fazerem alianças à direita. Evidentemente, é preciso provar e não apenas acusar [11]. No entanto, se examinarmos o governo atual, veremos que, a despeito de se reconhecerem avanços em muitos setores, ele tem sérias alianças à direita e suas principais políticas são aquelas que atendem aos interesses dos grandes grupos econômicos.
NOTAS
[1] A primeira reforma estrutural feita pelo governo Lula foi a reforma da previdência do setor público, que o governo FHCtinha tentado fazer, mas não tinha conseguido, principalmente por causa da oposição do PT. No governo, o PT a fez, para atender aos interesses do capital privado.
[2] "Indígenas vivem em ‘Faixa de Gaza brasileira’, diz Eduardo Viveiros de Castro". "Por que os índios lideram o ranking dos suicídios no Brasil?" Blog de Bruno Paes Manso. O Estado de São Paulo, 07/07/2014.
[3] “Cientistas pedem a suspensão dos transgênicos em todo o mundo”. Carta de 815 cientistas de todo o mundo chama a atenção dos governos para os riscos dos transgênicos: “Nós, cientistas abaixo-assinados, pedimos a suspensão imediata de todas as licenças ambientais para cultivos transgênicos e produtos derivados dos mesmos, tanto comercialmente como em testes em campo aberto, durante ao menos cinco anos; (...)”. As razões são os perigos que os transgênicos representam para a biodiversidade, a segurança alimentar, a saúde humana e animal; além disso, eles intensificam o monopólio corporativo, exacerbam as desigualdades e impedem a mudança para uma agricultura sustentável que garanta a segurança alimentar e a saúde em todo o mundo. 12/06/2014.
[4] Além do excelente documentário de Sílvio Tendler“O veneno está na mesa”, cabe citar o livro que Marie-Monique Robin publicou analisando a consequência do uso de pesticidas, fungicidas, inseticidas (comumente chamados de agrotóxicos) para os agricultores, em primeiro lugar, e para todos os que se utilizam dos alimentos produzidos com o uso destes produtos químicos, intitulado “Nosso veneno cotidiano” (“Notre poison quotidien”, Paris/Issy les Molineaux, Éd. La Découverte/Arte Éditions, 2011).
[6] Neste governo, os juros só baixaram durante um ano, depois voltaram a subir.
[7] Sobre este tema, ver Guilherme Delgado“Desigualdade social no Brasil”, no livro Os Anos Lula. Contribuições para um balanço crítico 2003-2010 (Rio de Janeiro, Garamond, 2010), p. 413-418.
[8] A combinação de superávit primário (...) com a política monetária de juros altos incidentes sobre a dívida pública resulta “num dos mais perversos mecanismos de transferência de renda dos pobres para os ricos de que se tem notícia na história do capitalismo. (...) Na verdade, o mais poderoso mecanismo de concentração de renda na economia é essa combinação de política fiscal e monetária perversa, onde o Estado atua como um redistribuidor de renda e de riqueza a favor dos poderosos” (Assis, 2005: 89)(Trecho do meu artigo “Risco de volta da direita?”, de novembro/2013).
[9] Existem propostas para o Brasil já elaboradas que foram divulgadas nos últimos meses: por exemplo, a “Agenda Brasil Sustentável”, apresenta sete eixos estratégicos, preparados por 60 organizações da sociedade civil; mais de 60 movimentos sociais e entidades apresentaram recentemente uma plataforma política para debate no processo eleitoral. Várias das políticas e iniciativas que elenquei aqui constam destas propostas.
[10] Ver: Ivo Lesbaupin“Por novas concepções de desenvolvimento”. In: ABONG (org.). Por um outro desenvolvimento. São Paulo, Maxprint Editora e Gráfica, 2012, p. 37-48.
[11] Há candidatos que se apresentam claramente de direita, não precisa demonstrar.

Militares, ciências, Educação Popular.

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