Tuesday, May 31, 2016

“Escolas sem partido” ou Pensamento Único?

“Escolas sem partido” ou Pensamento Único?

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160529-PensamentoÚnico
Ao naturalizar desigualdade e opressão e pretender aulas “neutras”, projeto em exame no MEC busca silenciar vozes e criar espaços de conformismo e resignação às injustiças
Por Pedro Henrique Oliveira Gomes
Para o projeto Escola Sem Partido, discutir feminismo e homofobia é doutrinação ideológica e imposição da ideologia de gênero nas escolasi. Como reflexo da sociedade, as escolas são espaços nos quais a opressão às mulheres e a discriminação sexual são constantes. Na maioria dos casos, as ações e as reações são silenciadas e banalizadas. Será necessário promover tal discussão nas escolas? A seguir, veremos algumas pesquisas sobre o assunto. Certamente, nos mostrarão a urgência da discussão na sociedade e nas escolas.
Segundo dados do Mapa da Violência 2015ii, de Julio Jacobo Waiselfisz, entre 2003 e 2013, o número de vítimas do sexo feminino mortas no Brasil passou de 3.937 para 4.762, incremento de 21,0% na década. As 4.762 mortes em 2013 representam 13 homicídios femininos diários. Quando analisamos os casos de feminicídio, a população negra é vítima prioritária. Em 2014, o Sistema Único de Saúde atendeu 23.630 casos de violência sexual, a maioria envolvendo crianças e adolescentes. Segundo informações presentes no estudo “Violência contra a mulher: feminicídios no Brasil”iii, de 2013, realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a Lei Maria da Penha, que entrou em vigor em 2006 para combater a violência contra a mulher, não teve impacto no número de mortes por esse tipo de agressão.
Quando o assunto é escola, os dados sobre assédio ou violência contra mulheres estudantes são escassos ou inexistentes, nas secretarias de educação. Já sobre discriminação contra homossexuais os dados são preocupantes. Em pesquisa realizada pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no interior de São Paulo, 32% dos homossexuais entrevistados afirmaram sofrer preconceito dentro das salas de aula e também que os educadores ainda não sabem reagir apropriadamente diante das agressões no ambiente escolar, que podem ser físicas ou verbais.iv Os dados, segundo os pesquisadores, convergem com aqueles apresentados em pesquisa do ministério da Educação, que ouviu 8.283 estudantes na faixa etária de 15 a 29 anos, no ano letivo de 2013, em todo o país, e constatou que 20% dos alunos não querem colega de classe homossexual ou transexual.
Na mídia, além da reprodução dos discursos e da estética de uma sociedade patriarcal, alguns personagens com grande visibilidade provocam e se promovem a partir de atitudes machistas, como o humorista Danilo Gentili e o ator Alexandre Frota. Por sinal, em recente audiência com o ministro da Educação, Mendonça Filho, Frota e um grupo associado ao movimento Escola Sem Partido levaram suas propostas para transformar a educação brasileira. Certamente, Alexandre Frota tem todo o direito de ser ouvido pelo ministro da Educação. Porém, quais os grandes problemas? Trata-se de alguém com passado marcado por machismos e atitudes boçais, conforme dito anteriormente. Além disso, há desigualdade no diálogo. Todos deveriam ser ouvidos. Os estudantes das escolas ocupadas estão sendo ouvidos? Muito pouco. Os professores em greve estão sendo ouvidos? Um pouco mais — porém, de forma, marginalizada. Até agora, reitores de universidades públicas federais não conseguiram marcar encontros com o atual ministro. Enfim, é preciso superar a seletividade do diálogo e analisar criticamente o projeto levado por Frota e sua trupe.
Voltemos ao parágrafo inicial. Qual é o absurdo do projeto Escola Sem Partido? Ignora-se a realidade para dar continuidade ao projeto de educação e sociedade em que vivemos faz tempo. O que esse movimento quer não é transformar a educação brasileira. Pretendem frear alguns avanços pedagógicos e sociais que tivemos nos últimos 15 anos, como as leis 10.639/03 e a 11.645/08. E por que apenas frear? Se analisarmos os conteúdos trabalhados e as atitudes desenvolvidas nas escolas, veremos poucas mudanças em relação à educação tradicional, conservadora e meritocrática. Nas salas de aula, falamos sobre (e muitos cultuam) a cultura eurocêntrica, o consumismo moderno, o agronegócio, a urbanização do mundo, a atuação das empresas multinacionais e suas grandes marcas, a corrida desenvolvimentista, a fábula da sustentabilidade, em pensadores brancos, homens e europeus, entre outros assuntos marcados pela hegemonia do saber.
Nos lugares da vida, mulheres são agredidas, jovens negros são assassinados, a cultura é elitizada, os espaços públicos são murados e fortificados, o caminhar é vigiado, o sucesso é baseado unicamente na ascensão econômica, entre outros vendavais que nos levam ao mundo fabuloso da desigualdade e da perversidade das relações. Nos lugares de fé, os profetas e seus seguidores cultuam emocionalmente suas verdades, ignoram suas realidades, e almejam criar bolhas de satisfação pessoal e comunitária. Tudo isso acirrando as disputas pelo existir e pelo mundo em que vivemos.
Para subverter minimamente esse quadro, precisamos criar leis para discutir a nossa origem e conhecer a história e a cultura africana e indígena nas escolas. Na prática, subvertemos sistemas para discutir a vida, a realidade e outros saberes necessários para transformar nossas ideias, nossas práticas, nossos espaços, nossas relações, nossa existência.
Neste contexto, a Escola Sem Partido (ou, melhor dita, Escola de Pensamento Único) é um projeto para silenciar vozes, buscar estabilidades e criar novos espaços de conforto e conformismo social, cultural e intelectual. A instabilidade, o diferente, a emergência incomodam. Discutir as desigualdades sociais, o feminismo, a discriminação sexual, entre outros assuntos, é provocar instabilidades nesse sistema de histórias e pensamentos únicos. Doutrinação ideológica está presente nas escolas desde sempre com seus conteúdos, com seus discursos, com suas relações. O pensar crítico é outro papo.
A atitude socialmente crítica é emancipação. Ela combate e rompe com o desenvolver enciclopédico e elitizante das escolas tradicionais. Educar é analisar as realidades e a nossa sociedade, selecionando aquilo que é urgente para ser conhecido, discutido, problematizado. Se analisar criticamente as realidades é um problema, que possamos subverter a lógica do pensamento único. É preciso prosseguir na luta para garantir uma educação para a liberdade e para a autonomia. Por uma educação que reconheça nossos povos tradicionais e seus saberes, garanta o bem estar das pessoas, valorize o fazer coletivo, pratique a democracia nas suas relações, entre outros assuntos que integram a educação em direitos humanos, especialmente por um mundo socialmente justo e ambientalmente responsável. Contra qualquer tipo de silenciamento, é preciso pensar, refletir, dialogar. Porém, é extremamente necessário fazer, agir.
Até porque, nosso grande Paulo Freire já mandou: “Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica”v. Nas palavras do educador, é necessário sermos homens e mulheres radicais nesse sistema atual. A radicalidade está na luta por uma educação mais dialógica, humana e ativa marcada pela autonomia do educando e pela liberdade na construção dos saberes e nos caminhos escolhidos para a vida.
ivVer estudo “Discriminação e violência homofóbica segundo os participantes da 6ª parada do orgulho LGBT de Sorocaba-SP: subsídios para (re) pensar as práticas educativas”, publicado por Marcos Roberto Vieira Garcia, Viviane Melo de Mendonça e Kelen Christina Leite no periódico Cadernos de Pesquisa. Disponível em:http://www.periodicoseletronicos.ufma.br/index.php/cadernosdepesquisa/article/download/4189/2224.
vLer com afeto o livro Ação Cultural: para a liberdade e outros escritos, publicado pela editora Paz e Terra.

Na França, a classe trabalhadora (re)vive?

Na França, a classe trabalhadora (re)vive?

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Um mar de trabalhadores desafia, em Paris, políticas de ataque aos direitos sociais. Os sindicatos serão, ainda, uma força rebelde?
Um mar de trabalhadores desafia, em Paris, políticas de ataque aos direitos sociais, lançadas por governo que se diz “socialista”. Os sindicatos serão, ainda, uma força rebelde?
Provocados por contra-reforma trabalhista, sindicatos paralisam portos, trens e até jornais. Que diz retomada pode dizer às lutas emancipatórias?
Por Milton Pinheiro
A luta dos trabalhadores franceses contra o ataque daquele Estado burguês está se consolidando como uma lição para os trabalhadores do mundo. Trata-se de uma quadra de profundos ataques ao fundo público, aos direitos sociais e trabalhistas, e de políticas neoliberais radicais que, mesmo do ponto de vista capitalista, aprofundam a crise do sistema. É uma tentativa desesperada, e vulgar, da ordem do capital, de tentar revalorizar a sua lógica a qualquer custo.
Após intenso processo de mobilização e enfrentamento com a repressão do governo da social-democracia francesa – aquela que tragicamente, em qualquer cenário de crise econômica, procura sempre os ombros da classe trabalhadora para colocar o ônus das contradições da crise sistêmica do capital – surgiu nesta quinta-feira (26/5) uma resposta poderosa. É digna da cultura política revolucionária que advém dos jacobinos da revolução francesa, dos trabalhadores da primavera dos povos de 1848, dos lutadores da Comuna de Paris e tantos outros movimentos de luta da classe trabalhadora em defesa dos seus direitos. A França não teve, nesse dia, a circulação de jornais que não publicaram o comunicado público da CGT (Confederação Geral do Trabalho). Apenas o histórico jornal L’Humanitécirculou pelas bancas do país.
A ação dos trabalhadores franceses e suas organizações de classe impediu que os grandes panfletos da burguesia francesa, que não respeitam o direito à informação pública, fossem impressos e chegassem às bancas.
Nestes últimos dias, os trabalhadores radicalizaram suas ações contra o pacote de medidas do governo da ortodoxia neoliberal de François Hollande, que ataca os direitos trabalhistas e previdenciários dos franceses que estão no mercado de trabalho, bem como da juventude que irá adentrar esse espaço da vida social. Como reação, avança uma intensa jornada de lutas com grandes manifestações políticas e culturais para impedir a catástrofe social que o capital mundial e seu consórcio francês querem impor.
O bloco de lutas dos trabalhadores tem organizado, e avançado, na mobilização social. Dezenas de milhares de trabalhadores ocuparam as ruas de Paris, cercaram com atividades culturais o monumento da República, protestaram por toda a França e têm enfrentado com determinação a repressão policial. A CGT também conseguiu o apoio dos trabalhadores do controle ferroviário e aéreo, que já paralisaram suas atividades.
A intensa jornada de lutas afirmou-se de forma vitoriosa sobre algumas das mais importantes atividades industriais do país, com a paralisação de 16 das 19 usinas nucleares e o fechamento da grande maioria das refinarias e depósitos de combustível. A escassez de combustível já atinge várias localidades da França.
O bloco de lutas promete novas ações para impedir o êxito da “reforma” trabalhista anunciada, que mais uma vez atinge a jornada de trabalho com a possibilidade de aumento de 48 até 60 horas de trabalho semanal, de acordo os interesses do patrão. O governo Hollande, através dessa contrarreforma proposta, permite total liberdade ao patronato para flexibilizar e precarizar as relações de trabalho.
Esse projeto propõe o fim do adicional de horas extras para aqueles que trabalham além das 35 horas semanais, quebra a negociação por ramo de atividade e categoria para possibilitar acordos por empresas. Fato que pode quebrar a unidade da classe e a sua capacidade de articulação e organização. No entanto, como a história das lutas sociais já comprovou, os trabalhadores franceses reagiram com grande mobilização e intensidade a este ataque que veio, mais uma vez, pelas mãos da social-democracia européia.
Lutas com ações de grande impacto têm sido feitas, a exemplo do bloqueio e fechamento do porto de Le Havre na Normandia, que atingiu fortemente o deslocamento pela ponte que conecta esse importante porto às cidades e outras localidades do país. Impediu-se, inclusive, que as forças da repressão pudessem se locomover para agir essa região. Informações também apontam que piquetes de trabalhadores atingem a Bretanha, paralisando a produção industrial na área portuária de Brest.
Com essa jornada de lutas os trabalhadores franceses nos lembram: é preciso lutar e é possível vencer. O avanço desse bloco de lutas deverá tender à derrota do governo.
A França das lutas operárias e libertárias nos avisa que as barricadas estão à vista, cabe agora aos trabalhadores do mundo levantá-las por sua emancipação.

Democracia e Capitalismo, divórcio definitivo

Democracia e Capitalismo, divórcio definitivo

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160529-Kahlo
Num livro que diz muito ao Brasil, Wolfgang Streeck expõe mecanismos que permitiram à aristocracia financeira controlar Estado e mídia. Saída: assumir a separação, pensar numa política livre do capital
Por Ladislau Dowbor | Imagem: Frida Kahlo, Última Ceia

RESENHA DO LIVRO:Buying Time – The delayed crisis of democratic capitalism, de Wolfgang Streeck – Verso, Londres, New Left Books, 2014 (original: Berlin, 2013)
Streeck traz na sua mensagem central a nossa evolução para um capitalismo sem democracia. Segundo ele, não vivemos o fim do sistema, mas o ocaso do capitalismo democrático. Por meio do endividamento do Estado e de outros mecanismos, gera-se um processo em que os governos, obrigam-se cada vez mais, a prestar contas ao “mercado”, virando as costas para a cidadania. Com isso, o que conta, para a sobrevivência de um governo, já não é sua capacidade de responder aos interesses da população que o elegeu – e sim se o mercado, ou seja, essencialmente os interesses financeiros, sentem-se suficientemente satisfeitos para declará-lo “confiável”. De certa forma, em vez de república, ou seja, res publica, passamos a ter uma res mercatori, coisa do mercado. Um quadro-resumo ajuda a entender o deslocamento radical da política: (81)
Estado do cidadão
Estado do mercado
Nacional
Internacional
Cidadãos
Investidores
Direitos Civis
Direitos Contatuais
Eleitores
Credores
Eleições (periódicas)
Leilões (contínuos)
Opinião Pública
Taxas de Juros
Lealdade
“Confiança”
Serviços Públicos
Serviço da Dívida
Naturalmente, num dos casos, o Estado financia-se através dos impostos; no outro, do crédito. Um governo passa assim a depender “de dois ambientes que colocam demandas contraditórias sobre o seu comportamento”(80). A opinião pública preocupa-se com a qualidade do governo; mas para o que chamamos misteriosamente de “os mercados”, o que importa é a “avaliação de risco”, as probabilidades de este mesmo governo deixar de pagar elevados juros sobre a sua dívida. A opção de sobrevivência política pende cada vez mais para o segundo lado. “Ao tentar entender o funcionamento do estado democrático regido pela dívida (democratic debt state), ficamos logo surpresos que ninguém parece saber quão importante é o ‘estado do mercado’ (Marktvolk).”(82)
Esta interpretação casa de maneira impressionante com o caso brasileiro. Na famosa Carta de Junho, de 2002, o então candidato Lula comprometeu-se a “respeitar os contratos”. Estive na leitura deste documento. “Vou ler esta carta”, disse Lula ao colocar o óculos, “porque quero ser eleito presidente da República”. Ou seja, ia respeitar os interesses financeiros. Os avanços da sua gestão foram indiscutíveis ao promover os interesses do andar de baixo do país, gerando uma dinâmica impressionante de transformações. Mas os juros foram se acumulando, e quando Dilma, na fase final do primeiro mandato, passou a reduzir os juros da dívida pública, os juros para pessoas jurídicas e para pessoas físicas, buscando restabelecer o equilíbrio financeiro indispensável, começou a guerra total.
Os interesses financeiros viam-se eles mesmos intocáveis, e partiram para recuperar o poder. “Em relação ao seu Marktvolk, ou seja, aos mercados, “o governo precisa cuidar de ganhar e preservar a sua confiança, ao assegurar de maneira conscienciosa o serviço da dívida que lhes deve e ao fazer parecer seguro que pode fazê-lo e continuará a fazê-lo no futuro também.”(81) As impressionantes mamas da dívida pública devem ser mantidas, ou não haverá governo. Podemos ter democracia, conquanto esta democracia sirva dominantemente aos mercados. E quando, por esgotamento de recursos ou excessivo acúmulo de dívidas, é preciso escolher, ou o governo se dobra aos mercados, ou termina a experiência democrática de convívio entre os dois senhores.
Streeck tem em mente as dinâmicas europeias, mas é impressionante como o sistema se universalizou. Ao expor o que se exige dos governos para que mantenham a confiança dos mercados, e em consequência sobrevivam, o autor traça um excelente resumo do que hoje vivemos. “Os cortes de despesas propostos afetarão essencialmente pessoas cuja baixa renda torna-as mais dependentes de serviços públicos. O emprego será reduzido ainda mais, e os salários no setor público serão espremidos, o que será acompanhado de novas ondas de privatização, bem como de diferenças salariais mais amplas. O acesso aos serviços públicos universais – por exemplo, nos setores de saúde e de educação – será crescentemente diferenciado dependendo da capacidade de compra das diferentes clientelas. No conjunto, o corte de gastos e a redução dos níveis de atividade governamental reforçarão o mercado como principal mecanismo de distribuição de oportunidades na vida, estendendo e complementando o programa neoliberal de desmantelamento do estado de bem-estar.”(119)
As resistências tornam-se difíceis, em particular pela própria globalização, que gera instituições “isoladas da pressão eleitoral”: “As políticas domésticas tornam-se mediadas e neutralizadas ao se trancar os estados-nação em acordos supranacionais e regimes regulatórios que limitam a sua soberania”.(115) Por mais que seja voltado essencialmente para as dinâmicas da Europa, o estudo de Streeck mostra claramente a que ponto avançamos na globalização, e a que ponto se estendeu a visão chapa-branca do poder financeiro. Ela impõe ao mundo, e com raras exceções em qualquer país, o mesmo esquema: o estado transforma-se no sistema contemporâneo de captura dos recursos da sociedade, desviando nossos impostos por meio do sistema público.
Convencer governos de que é mais simples aumentar a dívida do que enfrentar a guerra contra o aumento dos impostos é relativamente fácil. “Os cidadãos passam a esperar cada vez menos do estado, e portanto se veem obrigados a desembolsar cada vez mais por serviços privados, tornando-se mais relutantes em pagar impostos.” (124) O processo de exploração dos trabalhadores, para gerar a mais-valia que conhecemos, não desapareceu, e continua válido nas empresas. Mas a mais-valia financeira, captada por meio de mecanismos da dívida, simplificou a tarefa dos grupos dominantes de sempre. Com isto, é o próprio governo que elegemos que passa a transferir para “os mercados” o dinheiro dos nossos impostos. Esta “terceirização” da extração da mais valia, em que o sistema financeiro utiliza a máquina do estado, coloca os governos em conflito direto com a sua missão constitucional de responder à vontade cidadã manifestada pelo voto. Mas se não o fazem, o que podem pesar meros 54 milhões de votos?
O que sobra da democracia? O poder dominante dos gigantes corporativos é exercido por pessoas não submetidas a voto. Os políticos são eleitos, cada vez mais, com o dinheiro das mesmas corporações. Os grupos de mídia já pertencem, com frequência, às corporações; mas de toda forma dependem vitalmente da publicidade que estas contratam. O judiciário é cada vez mais privatizado, com a expansão do sistema dos settlements (acordos) judiciais que colocam as corporações ao abrigo da lei: e os juízes não são eleitos. A democracia realmente existente constitui hoje uma chama frágil que sobrevive neste ambiente de maneira cada vez mais precária. Não se trata apenas de resgatar a política econômica – trata-se de resgatar a própria democracia.
Os desafios são claros: se este sistema “não pode mais sequer produzir a ilusão de crescimento com equidade, chegará o tempo em que os caminhos do capitalismo e da democracia têm de se separar…A alternativa ao capitalismo sem democracia é democracia sem capitalismo, ou pelo menos sem o capitalismo que conhecemos” (173), escreve Streeck. Hoje, prossegue ele, “democratização deveria significar construir instituições por meio das quais os mercados possam ser trazidos de volta para o controle da sociedade: mercados de trabalho que deixam espaço para a vida social, mercados de produtos que não destroem a natureza, mercados de crédito que não geram promessas insustentáveis em massa. Mas antes que algo deste tipo possa realmente entrar na agenda, no mínimo serão necessários anos de mobilização política, e a continuidade da ruptura da ordem social que hoje se aprofunda diante dos nossos olhos”.

Monday, May 30, 2016

'O plano econômico do PMDB não serve para nada. É só marketing'. Entrevista especial com Guilherme Delgado


'O plano econômico do PMDB não serve para nada. É só marketing'. Entrevista especial com Guilherme Delgado

"O governo Temer está muito mais perdido do que estava o governo Dilma. Diferentemente do golpe de 64, em que a direita tinha um programa e tinha intelectuais que forjavam propostas de longo prazo, agora não se tem isso; trata-se de algo imediatista e voltado para destruir o governo anterior, sem nenhuma proposta.”, avalia o economista.
Foto: correiodosul.com
“É difícil de analisar o que o governo está querendo” com as propostas anunciadas para a economia na semana passada, diz Guilherme Delgado à IHU On-Line, na entrevista a seguir, concedida por telefone. Por enquanto, as medidas “sinalizam mais uma reunião de marketing do que propriamente uma reunião de política econômica, porque não tem um ato normativo proposto ao Congresso, nem nota técnica que reflita ou explique essas decisões”, afirma.
Na avaliação do economista, dado o atual quadro de dois anos consecutivos de recessão na economia, e com uma “situação de desemprego aberto gravíssima”, que chega a “200 mil desligamentos formais por mês”, “a política de juros tem de ceder à necessidade de se dar alguns estímulos para recuperar a economia”.
Entre as alternativas que poderiam ser discutidas nessa conjuntura, Delgado chama a atenção para “algumas excrescências”, sobre as quais “reina absoluto silêncio”, entre eles, como explicar que “pessoas que pagam 27,5% sobre os salários se defrontem com titulares de rendimentos do capital que têm tributação zero num país que está carente de recursos dessa natureza. Temos de revisitar isso, como também é preciso revisitar o campo das faixas de tributação no imposto de renda, a gigantesca sonegação que alimenta a dívida ativa para com a União, para que se possa, no ajuste fiscal, criar o mínimo de justiça, porque ajuste fiscal não pode ser um nome fantasia”, adverte.
Outro ponto fundamental, menciona, é conter os juros da dívida pública. “Não vejo providências no sentido de reestruturar e reequacionar essa relação do sistema financeiro com o Estado. Esse parece um assunto interditado, que nem é discutido”. Para ele, alguma mudança tributária é necessária porque o déficit precisa ser solvido. Apesar de não considerar a CPMF a melhor alternativa tributária, Delgado afirma não ver “no horizonte como se poderia fazer qualquer outra coisa nova nesse campo abandonando os clássicos mecanismos mais simples de tributação que a CPMF contém, embora com distorções de outra natureza”.
O economista também defende um plebiscito para solicitar novas eleições gerais, e a discussão sobre a implantação do parlamentarismo. “Nas novas eleições, poderia se propor o parlamentarismo, onde a situação seria mais fácil de resolver. (...) O plebiscito poderia ser feito este ano para formalizar uma emenda constitucional e marcar as eleições para o ano que vem. Assim, o governo Temer se caracterizaria como um governo transitório, o governo Dilma se despediria, porque já acabou, e aí colocaríamos na população a responsabilidade de eleger novos representantes”.
Guilherme Delgado é doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp. Trabalhou durante 31 anos no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea.
Confira a entrevista.
Foto: t3.gstatic.com
IHU On-Line - Como o senhor analisa o atual momento econômico e político do país após o afastamento da presidente Dilma?
Guilherme Delgado – O quadro de instabilidade política e econômica que havia antes do afastamento da Dilma não mudou, ou seja, não há estabilidade política nem econômica, até porque o campo das dificuldades é o mesmo — diria até que é maior, porque depois do afastamento dela se tem um quadro político-jurídico mais frouxo para se pensar a ordem institucional.
IHU On-Line – O governo interino de Temer anunciou que o déficit fiscal primário é de 170 bilhões e não de 96 bilhões, como apresentado no governo Dilma. Como analisa esses números?
Guilherme Delgado – No começo do governo Temer foi feita uma tratativa com estados e municípios no sentido de fazer uma renegociação da dívida, na qual houve mudanças de critérios e ingresso de recursos segundo a forma anterior. A grande diferença entre os números tem a ver com a renegociação das dívidas dos estados com a União, que todos acham muito bom, mas acontece que essa renegociação aumenta o tamanho do déficit primário. Portanto, não acho que a mudança no valor se deve a um cálculo errado, mas a formas novas de tratar a questão fiscal, que aumenta no curto prazo o tamanho do déficit primário.
É preciso deixar claro que se trata do déficit antes de considerar as despesas financeiras, porque o déficit nominal é muito maior. Esse déficit primário dá em torno de 6 trilhões. O déficit nominal é de 10 a 11% do PIB. Tem uma despesa financeira gigantesca, que é a rolagem do serviço da dívida, e essa é a parte principal do déficit brasileiro, portanto o déficit primário é apenas a ponta do iceberg.

"A crise conjuntural do orçamento e da política fiscal está sendo transformada em uma crise permanente"

 

IHU On-Line - Que avaliação geral faz do pacote econômico anunciado pelo governo Temer e por Henrique Meirelles?
Guilherme Delgado – As medidas anunciadas foram tomadas um dia depois da divulgação das gravações de Romero Jucá e, portanto, minha impressão foi a de que se tratou de lançar uma notícia diferente, positiva, de providências para desviar o assunto das gravações, porque, desde o anúncio das medidas econômicas, não saiu nenhum detalhamento de medidas normativas.
Fixação do gasto orçamentário segundo a inflação
A principal medida anunciada nesse pacote, que consiste na fixação de um limite correspondente à inflação anterior para o gasto orçamentário, nominalmente o gasto de saúde e educação, não deixa claro se a medida se refere somente a essas duas áreas ou não. Se for só em relação à saúde e à educação, tem de se revogar da Constituição uma meia dúzia de dispositivos que tratam dos percentuais de aplicação nessas áreas. Se a medida se aplica a outros setores, como a previdência, teria de estar especificado.
Como acabamos de ver, o iceberg é a despesa financeira, mas sob a despesa financeira não há limites e, portanto, essa medida anunciada é ineficiente para enfrentar o tamanho do problema que se tem. Se a medida limitar gastos com saúde e educação, isso significa que se colocará na Constituição um dispositivo para tratar de um assunto conjuntural, ou seja, a crise conjuntural do orçamento e da política fiscal está sendo transformada em uma crise permanente. É como se dissessem: não se põe um centavo a mais para construir novas escolas, hospitais, tratar de doentes, construir postos, porque não tem investimento. E mesmo as despesas correntes, de custeio, se passarem do limite da inflação, serão cortadas. Isso simplesmente paralisa a política social. Esse tipo de cogitação é incompatível com as necessidades do sistema público de saúde e educação. Pior ainda será se isso for estendido a outros setores, como o da previdência. Esse setor paga benefícios acumulados e se colocarem um limite nele, mesmo com emenda constitucional, seria uma emenda inconstitucional, porque vai ferir o direito adquirido dos aposentados e pensionistas.
É difícil de analisar o que o governo está querendo com essas propostas, porque na verdade elas sinalizam mais uma reunião de marketing do que propriamente uma reunião de política econômica, porque não tem um ato normativo proposto ao Congresso, nem nota técnica que reflita ou explique essas decisões. Apesar disso, a mídia repercute tudo sem cobrar mais detalhes, afirmando que é por aí mesmo.
Captura de recursos do BNDES
A outra medida anunciada, que consiste em capturar recursos do BNDES, é a clássica pedalada fiscal e foi por isso que, supostamente, a Dilma foi impedida. Ou seja, o BNDES tem um contrato com o Tesouro, isto é, o Tesouro empresta dinheiro ao BNDES, que por sua vez empresta a terceiros como capital de longo prazo, que retorna aos poucos. Contudo, o que o governo fez foi dizer que queria o dinheiro de volta, mas só se pode devolver o dinheiro nos prazos contratuais. O fundo do BNDES não é de disponibilidade do Tesouro; o que é de disponibilidade do Tesouro são os aportes de pagamento do BNDES. Ou seja, se o Tesouro empresta um valor X ao BNDES, o banco devolverá isso em dez ou quinze anos, que é o tempo de retorno do capital de empréstimo. Essa é uma medida mal explicada e dada como se fosse solução do déficit fiscal.
Outra medida é a diminuição do fundo soberano do pré-sal, mas essa e outras medidas não parecem indicar que exista algo estudado. Sente-se apenas a compulsão de apresentar um rol de medidas, com frases de efeitos, mas não se governa assim.
A outra medida que anunciarão para breve, em julho, é da reforma da previdência, com desvinculação de benefícios da previdência e idade única. No pacote, a reforma da previdência ainda é uma conjectura; não tem nada anunciado.
IHU On-Line – Se essas medidas não contribuem para enfrentar a crise nem para estancar o déficit fiscal, o que poderia ser feito na atual conjuntura de crise econômica? O senhor sempre fala da necessidade de baixar a taxa de juros. Vê perspectiva de que isso vai ocorrer?
Guilherme Delgado – Antes havia uma inflação de 10% e hoje o governo está trabalhando com uma inflação de 7%, o que significa que ela caiu três pontos percentuais. Então, alguma folga tem de se dar na política monetária, porque ela não pode ser absoluta, em relação a qual todas as demais políticas têm de ceder, até porque ela conduz o sistema para uma determinada direção que, no caso, não é desejável.
Estamos numa situação de desemprego aberto gravíssima, pior do que a do ano passado, que teve 1,5 milhão de desempregos formais; este ano a trajetória é maior. Portanto, a política de juros tem de ceder à necessidade de se dar alguns estímulos para recuperar a economia — esse é um caminho, mas por ele também não se tem um alívio do déficit nominal, que é o pior da história.
Do ponto de vista tributário, temos algumas excrescências funcionando e sobre as quais reina absoluto silêncio. Por exemplo, o sistema da seguridade social se alimenta da contribuição sobre o lucro líquido, mas as pessoas se esquecem de mencionar que desse lucro líquido são excluídos os dividendos, que têm tributação zero. Como se pode explicar que pessoas que pagam 27,5% sobre os salários se defrontem com titulares de rendimentos do capital que têm tributação zero num país que está carente de recursos dessa natureza.
Temos de revisitar isso, como também é preciso revisitar o campo das faixas de tributação no imposto de renda, a gigantesca sonegação que alimenta a dívida ativa para com a União, para que se possa, no ajuste fiscal, criar o mínimo de justiça, porque ajuste fiscal não pode ser um nome fantasia. Tem de haver alguma justiça tributária nesse processo para ter legitimidade para pedir a outros setores, que serão objeto de corte, a ideia de uma certa equanimidade e ao mesmo tempo uma equanimidade que aponta para proteger os setores que são mais débeis na cadeia social.
Por exemplo, não se pode cortar benefícios de salário-mínimo para pessoas que estão num patamar básico de sobrevivência, não se pode cortar o Bolsa Família nem tomar atitudes como a que o Ministro da Fazenda anunciou, de capturar o fundo de empréstimo do BNDES, porque é o fundo que financia investimentos. Se o próprio governo quer lançar um programa de concessões de obras públicas, elas precisam de financiamento e capital de longo prazo. Se não há possibilidade de dispor desse capital, eles vão recorrer a capitais muito mais caros, que tornam a concessão inviável.
Então, o que percebo nesse momento é que o governo Temer está muito mais perdido do que estava o governo Dilma, que já estava perdido. Diferentemente do golpe de 64, em que a direita tinha um programa e tinha intelectuais que forjavam propostas de longo prazo, agora não se tem isso; trata-se de algo imediatista e voltado para destruir o governo anterior, sem nenhuma proposta. O plano econômico do PMDB não serve para nada; é só marketing.

  

"O plano econômico do PMDB não serve para nada; é só marketing"

IHU On-Line – A que atribui essa falta de propostas?
Guilherme Delgado – Se a economia não voltar a crescer, e se não há uma trajetória interna e externa para relançar investimentos e não há o mínimo de articulação social e econômica de uma nova hegemonia, as crises econômica e política vão ladeira abaixo. A recessão brasileira não é comum; já está no segundo ano, a taxa de desemprego aberto está na faixa de 200 mil desligamentos formais por mês e a agenda do PMDB não aponta nenhum caminho no sentido de recuperar a economia.
Eu me sinto desconfortável em falar isso, porque não quero ver a situação ir ladeira abaixo, mas como o governo aposta no limite da inflação do ano anterior, ou na proibição do BNDES de fazer novos financiamentos, não sei o que tem pela frente a partir desse rol de restrições.
Por outro lado, no que se refere à evolução da dívida, não vejo providências no sentido de reestruturar e reequacionar essa relação do sistema financeiro com o Estado. Esse parece um assunto interditado, que nem é discutido. No ano passado tivemos um déficit nominal de 9,3% do PIB, sendo 9 pontos percentuais de despesa financeira e 0,3 de despesa fiscal, e mesmo assim não se discute o sistema financeiro. A despesa financeira é criada autonomamente peloBanco Central, sem apreciação do Congresso, o que é uma excrescência, mas também não se discute isso.
O artigo 153 da Constituição – que, segundo as más línguas, o ministro Nelson Jobim teria dito que foi um dos dispositivos introduzidos na Constituição clandestinamente, sem votação - determina que o serviço da dívida pública é insuscetível de emenda pelo Congresso, portanto, é uma decisão do Banco Central. Isso é um absurdo do ponto de vista do Estado de direito e deveria ter sido mudado. O limite da dívida pública é, em todos os países, de competência do Congresso, que é a casa que tem a legitimidade de tratar de tributação e gastos.
IHU On-Line – Vislumbra mudanças no Banco Central com a escolha de Ilan Goldfajn?
Guilherme Delgado – Sobre os nomes escolhidos, a informação que tenho é a de que são nomes de preferência domercado financeiro, que aposta na lógica do retorno privado dos capitais. Ao mesmo tempo, não vejo nos intelectuais orgânicos conservadores uma formulação de longo prazo, como havia em 1964.
O grupo político, econômico, parlamentar e midiático que promoveu a campanha de desestabilização do governo Dilma, como também do impeachment, foi muito eficiente e derrotou o governo com um golpe branco. Agora, esse mesmo grupo, para governar, não parece ter uma estratégia de médio prazo para sair do impasse político e econômico em que a própria presidente se meteu. E ela reconheceu, em entrevista à Carta Capital, que em 2015, ao apostar no ajuste da forma que fez, agravou terrivelmente a recessão e a perda de apoio político.
Agora, o plano B, que seria um projeto de reestruturação para tirar o país desse atoleiro, não tem absolutamente nenhuma evidência de que as medidas anunciadas na semana passada tenham possibilidade de apontar nessa direção. Pelo contrário, podem piorar o quadro de recessão para um quadro de depressão e aí a situação pode ficar ainda mais incontornável.
Sou bastante reticente a essas medidas de aprofundamento do ajuste fiscal nesse formato, na linha de redução significativa da presença do governo, com liberalidade financeira, na expectativa de que venha um governo salvador; não acredito nisso. O que vem é mais instabilidade com todas as mazelas associadas a tal.
IHU On-Line - Seria o caso de retomar a CPMF?
Guilherme Delgado – Alguma mudança tributária é necessária num ajuste fiscal real porque, de fato, existe um déficit primário que precisa ser solvido. A solução imediatista do governo Dilma era a recriação da CPMF, que foi excluída nogoverno Lula e fez falta nas contas sociais. Creio que ou a CPMF ou alguma outra mudança mais associada à justiça distributiva precisaria vir, porque não se faz, nessa conjuntura, uma política de reestruturação econômica piorando ainda mais o quadro distributivo, nem somente através de cortes, que agravam mais a recessão e a perda de receita tributária da União e não resolvem o problema.
Preferencialmente, não deveria ser a CPMF, mas não vejo no horizonte como se poderia fazer qualquer outra coisa nova nesse campo abandonando os clássicos mecanismos mais simples de tributação que a CPMF contém, embora com distorções de outra natureza. Mas precisa de algum tipo de tributação para sair desse impasse.
Por enquanto, a política do governo Temer ainda continua produzindo factoides e não sabemos exatamente o que é. Do ponto de vista político, sinto que o campo midiático começou a investir na desestabilização do Temer – não estou entendendo aonde querem chegar – e temos duas peças contraditórias no jogo: uma presidente em processo de impeachment, que não tem condições de governar mesmo que volte, e um vice-presidente que está cada vez mais se revelando um governante “ingovernante”. Precisamos sair disso e alguma responsabilidade política é necessária: talvez um plebiscito de eleições gerais que nos dê possibilidade de pensar para frente. Eu me sinto angustiado de analisar e não ver como vamos sair daqui para frente com as alternativas Dilma/Temer.

"Eu me sinto angustiado de analisar e não ver como vamos sair daqui para frente com as alternativas Dilma/Temer"

IHU On-Line – Por que novas eleições significariam uma saída? O que poderá surgir com novas eleições?
Guilherme Delgado – De imediato seria preciso um plebiscito para pedir permissão de fazer novas eleições gerais, para que no ano que vem ou no final deste ano se fizessem novas eleições. Mas se continuar do jeito que está, com denúncias da Lava Jato sobre o governo, não será possível governar. A ideia de desestabilização permanente, que está na judicialização e politização judiciária, precisa ser limitada, porque o processo precisa ser mais sério. Ao mesmo tempo não se sabe qual é o grau de veracidade e legitimidade do que está sendo divulgado. Temos de ter discernimento ético e político para sair desse padrão de instabilidade.
Nas novas eleições, poderia se propor o parlamentarismo, em que a situação seria mais fácil de resolver. Mas se falar em parlamentarismo com esse Congresso, as pessoas ficam com ódio. Então, para começar com uma nova etapa, precisaríamos de um novo Congresso eleito. Agora, o plebiscito poderia ser feito este ano para formalizar uma emenda constitucional e marcar as eleições para o ano que vem. Assim, o governo Temer se caracterizaria como um governo transitório, o governo Dilma se despediria, porque já acabou, e aí colocaríamos na população a responsabilidade de eleger novos representantes.
Estou conjecturando porque não consigo divisar uma alternativa de governo Temer até 2018 com esse grau de envolvimento do PMDB com as tratativas na Petrobras, com a impossibilidade do governo do PT de governar, e não podemos ficar sem solução mais dois anos, com a crise econômica se aprofundando; aí haverá um caldo para golpistas de toda natureza.
Por Patricia Fachin

Militares, ciências, Educação Popular.

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