Tuesday, June 12, 2007

Morre o filósofo Richard Rorty, crítico da objetividade

Saiu na folha de São Paulo:

Morre o filósofo Richard Rorty, crítico da objetividade
Influente intelectual norte-americano sofria de câncer no pâncreas e tinha 75 anos; autor de "Verdade e Progresso", entre outros, criticava governo Bush

Pensador que atacava a existência de "verdades" exteriores aos discursos defendia um liberalismo de esquerda reformista

DA REPORTAGEM LOCAL
O filósofo norte-americano Richard Rorty morreu na última sexta-feira, aos 75, em Palo Alto, na Califórnia. Sua mulher, Mary Varney Rorty, anunciou ontem sua morte, causada por um câncer no pâncreas.
Rorty foi um dos mais importantes e influentes intelectuais da segunda metade do século passado, e sua reflexão é marcada, como a de muitos de seus contemporâneos, por uma crítica radical da metafísica. Do ponto de vista político, o norte-americano foi um liberal de esquerda reformista.
A crítica específica de Rorty à tradição moderna da filosofia se dava pela afirmação de que é impossível, para ele, separar um suposto mundo da "mente" (um sujeito do conhecimento) de um mundo exterior.
Conhecimento, portanto, não é a melhor adequação possível de idéias a esse mundo "exterior". Para os filósofos metafísicos e para a ciência, ele dizia, esse mundo serviria para testar ou, ao menos, para impor limites às construções de verdade do mundo da "mente", dos sujeitos.
Para Rorty, é sempre impossível fazer uma distinção entre o que é "dado" e o que é "adicionado pela mente". O conhecimento é, portanto, uma prática social e "conversacional", mais que qualquer reflexo mais ou menos bem sucedido do mundo exterior.
"Não há nenhuma outra base para se decidir o que conta como conhecimento e verdade do que aquilo que seus interlocutores deixarão você dizer numa troca aberta de defesas de idéias, de ataques e razões", disse o filósofo. "Truth is not out there", ou seja, não há verdade a ser encontrada, e ela não existe independente desses discursos, defendia Rorty.
Ele foi bastante atacado e criticado por suas posições, para muitos excessivamente relativistas. O filósofo dizia seguir a tradição do pragmatismo norte-americano, levada adiante por autores como Charles Sanders Peirce (1839-1914) e John Dewey (1859-1952).
Rorty encontrava críticos mesmo dentro dessa tradição, que, embora anticartesiana e defensora de que conceitos (ou melhor, práticas) como "verdade" e "conhecimento" são apenas instrumentos de melhor adaptação ao meio e de sobrevivência, ainda acreditariam em um "mundo lá fora" que restringiria nossas possibilidades discursivas.
Politicamente, dizia ter crescido num ambiente de esquerda crítico do stalinismo. Essa crítica encontraria mais tarde fundamento na sua teoria epistemológica, já que ele dizia que qualquer sistema que pose de desvelador de causas escondidas e sistemáticas para a exploração parte de uma idéia de realidade que, bem, não é real.
Para ele, haveria sempre um aspecto de ironia na defesa, necessária, do liberalismo, já que nenhum dos seus defensores pode afirmar que suas idéias são mais "verdadeiras" que as de seus opositores. Ainda assim seria necessário defendê-las em nome da diminuição do sofrimento no mundo.
Em anos recentes, Rorty fazia críticas à administração de George W. Bush, bem como à pregação de intelectuais antiamericanos. Em português, é possível ler obras como "Verdade e Progresso" (Manole, 472 págs., R$ 98) e "Pragmatismo e Política" (Martins, 134 págs., R$ 29,50). Seus debates com o alemão Jürgen Habermas aparecem em "Filosofia, Racionalidade, Democracia" (Unesp, 270 págs., R$ 37).

Fonte: São Paulo, terça-feira, 12 de junho de 2007. Cadeno Ilustrada.

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