Friday, June 30, 2017

Para Francisco, o chamado “desemprego natural” é uma “chantagem social”. Artigo de Andrea Terzi

“Vivemos um longo tempo em que pensávamos que, em uma sociedade, imperfeita por sua natureza, um pouco de desemprego era inevitável. Hoje, assoma-se outro modo de ver ainda mais traiçoeiro. É a convicção generalizada de que o progresso tecnológico e a robotização dos processos produtivos significam que o trabalho está desaparecendo.”

A opinião é do economista italiano Andrea Terzi, professor da Franklin University Switzerland, em artigo publicado por Avvenire, 29-06-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Nas palavras de Francisco, o trabalho é algo bem diferente de um mero instrumento para poder se dar ao luxo de consumir. É o “centro de todo pacto social” e, se é ruim, ou está ausente, ou “explora, esmaga, humilha, mata”, rompe-se o pacto social. Falando recentemente a uma plateia de trabalhadores, empresários e desempregados no distrito Riparazioni Navali, de Gênova, o papa deixou clara a diferença entre empresário e especulador: a ênfase na competição na empresa não é apenas um “erro cristão”, mas é também um “erro econômico”, porque “a empresa é, acima de tudo, cooperação, mútua assistência, reciprocidade”.

Trata-se de uma crítica avassaladora de um aspecto da política econômica que caracterizou os últimos 30-40 anos, independentemente da cor política dos governos. Isto é, que, no fundo, um pouco de desemprego faz bem, porque não se pode dar trabalho para todos, porque o risco de perder o emprego torna os trabalhadores maleáveis e eficientes, e porque a concorrência entre desempregados abaixa o salário e evita a inflação. 

Os economistas chamam-no de “desemprego natural”. Francisco o chama de “chantagem social”. Uma sociedade onde faltam oportunidades de trabalho para todos é uma sociedade infeliz, porque o trabalho é dignidade, autoestima, senso de valer alguma coisa, e o desemprego semeia infelicidade, doença, crime, terrorismo.

Vivemos um longo tempo em que pensávamos que, em uma sociedade, imperfeita por sua natureza, um pouco de desemprego era inevitável. Hoje, assoma-se outro modo de ver ainda mais traiçoeiro. É a convicção generalizada de que o progresso tecnológico e a robotização dos processos produtivos significam que o trabalho está desaparecendo. Passamos, assim, de uma época em que o pleno emprego era considerado possível, mas desaconselhável, a outra época em que o pleno emprego é considerado simplesmente impossível.

Sobre esse erro, a humanidade é reincidente. Nos tempos da mecanização do trabalho da terra, assim como nos tempos do progresso técnico da produção manufatureira, fez-se a mesma pergunta. O que poderemos produzir e consumir mais do que consumimos hoje? À mesma pergunta, hoje, não sabemos responder senão imaginando um mundo onde alguns trabalham (os mais instruídos) e outros recebem um subsídio na forma de uma renda universal para permitir que possam sobreviver.

Uma solução aparentemente razoável, que, na realidade, corre o risco de criar um vácuo entre aqueles que terão a capacidade de se expressar através do trabalho e aqueles que serão mantidos com um cheque que, quando for gasto, acabará nos bolsos de quem trabalha, aumentando a distância entre quem trabalha e quem é mantido.

Sobre esse ponto, Francisco é muito claro: “É preciso olhar sem medo para as transformações tecnológicas da economia e não se resignar à ideologia que está ganhando espaço por toda a parte, que imagina um mundo onde apenas metade ou talvez dois terços dos trabalhadores trabalharão, e os outros serão mantidos por um cheque social. Deve ficar claro que o objetivo verdadeiro a ser alcançado não é a ‘renda para todos’, mas o ‘trabalho para todos’!”. 

Muito mais útil do que a “renda universal” seria, então, um programa de trabalhos de transição retribuídos com uma renda mínima, mas digna, ao qual tenham acesso todos aqueles que aspiram a conservar e a desenvolver as próprias capacidades em vista de novas oportunidades no setor público ou privado.

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